Vanusa morre aos 73 anos
Cantora morreu nesta madrugada, na casa de repouso de Santos (SP) aonde estava morando há mais de 2 anos
A cantora Vanusa morreu neste domingo (8), aos 73 anos, na casa de repouso onde vivia em Santos. A causa da morte informada foi insuficiência respiratória. A artista chegou a ficar internada por 32 dias no Complexo Hospitalar dos Estivadores, na cidade do litoral paulista, e saiu em outubro. A filha de Vanusa, Aretha Marcos, confirmou a morte da mãe em uma publicação nas redes sociais.
Segundo a assessoria de imprensa de Vanusa, um enfermeiro percebeu, por volta das 5h30, que a cantora estava sem batimentos cardíacos. “Ontem ela teve um dia muito feliz com a visita da Amanda, a filha mais velha. Cantou, brincou, riu, se alimentou bem”, informa em nota divulgada à imprensa. “Nos últimos anos Vanusa teve depressão, problemas gerados pelo uso de medicamentos tarja preta em excesso, o que a deixaram muito debilitada.”
Nos anos 1970, Antônio José dos Santos foi um meia com boas passagens pelos times do Palmeiras e do Vasco da Gama. Quando estreou no futebol, seus cabelos longos e loiros deram a ele seu definitivo nome como jogador profissional: Toninho Vanusa. Esse episódio ajuda a entender a dimensão da fama que a artista carregava na época.
Ótima cantora e bonita, ela usou essa combinação para ganhar popularidade na TV. Os anos 1960 foram o ápice do entrelaçamento entre música e televisão no Brasil. A programação era farta em programas musicais, de vários gêneros. Vanusa Santos Flores, paulista nascida em Cruzeiro, em 1947, mas criada na mineira Uberaba, chegou a São Paulo e não demorou a ser notada. Ela pegou a fase final do programa “Jovem Guarda”, na Record. Embora pudesse gravar canções românticas intensas, dramáticas, Vanusa tinha um jeito moleque que exibia com desenvoltura nos estúdios. Assim, acabou escolhida para a segunda formação do elenco de “Os Adoráveis Trapalhões”, que foi produzido na TV Excelsior entre 1966 e 1968.
Neste que seria o embrião do lendário grupo dos Trapalhões, Renato Aragão teve companheiros como os cantores Ivon Cury e Wanderley Cardoso, o astro de luta-livre Ted Boy Marino e, na função de estrelinha romântica da trupe, Vanusa. O programa virou uma febre. Um dos elementos mais engraçados era justamente Vanusa, que muitas vezes não aguentava segurar o próprio riso nas gravações. Renato Aragão sabia disso e adorava levar a colega a gargalhadas fora de hora. Vanusa teve na época um romance com o colega de elenco Wanderley Cardoso. Ela gravou cinco álbuns entre 1968 e 1974, todos levando como título apenas seu nome, “Vanusa”. Sua evolução a cada disco é inegável, acompanhando uma mudança de repertório.
Os primeiros álbuns eram marcados por um pop romântico, de refrão fácil, deixando espaço para uma ou outra faixa de sonoridade psicodélica, influenciada pelo rock americano e inglês do fim dos anos 1960. A partir de seu terceiro álbum, ela gravou sob influência do cantor e compositor Antônio Marcos, com quem casaria e teria duas filhas, Amanda e Aretha. Mais sofisticado, o repertório do quarto disco, de 1973, incluiu seu primeiro hit nacional, “Manhãs de Setembro”. Nessa faixa, Vanusa se arriscou como compositora, em parceria com Mário Campanha, e levou ao país os versos libertários da canção: “Eu quero sair/ eu quero falar/ eu quero ensinar o vizinho a cantar/ nas manhãs de setembro…”.
Vanusa figurou constantemente na mídia por três motivos: sua música, sua presença intensa em programas de TV (a ponto de ser eleita por dois anos seguidos “a rainha da televisão”) e pelas notícias nada boas sobre seu relacionamento com Antônio Marcos. Também popular ao extremo, com o hit “Homem de Nazaré”, Antônio Marcos passou por um calvário de crises e tentativas de reabilitação. Seus excessos etílicos e químicos minaram a relação com Vanusa. Depois da separação do cantor, ela se casou com o produtor e diretor de TV Augusto César Vannucci, com quem teve um filho, Rafael.
Depois de estourar com outra canção, “Sonhos de um Palhaço”, de Antônio Marcos e Sérgio Sá, Vanusa gravou em 1975 seu álbum mais ambicioso, “Amigos Novos e Antigos”. O título do disco vem de uma das faixas, composta por João Bosco e Aldir Blanc. A lista de autores reflete uma clara virada de Vanusa em busca de um repertório nobre.
O álbum tem músicas de Milton Nascimento, Fernando Brant, Fagner, Carlinhos Vergueiro, Luiz Melodia e, para dar a Vanusa o maior sucesso da carreira, Belchior. Sua versão de “Paralelas” é impecável, com os versos contundentes “No Corcovado quem abre os braços sou eu/ Copacabana, esta semana, o mar sou eu/ como é perversa a juventude do meu coração/ que só entende o que é cruel, o que é paixão”.
Nos anos seguintes, ela insistiu em compositores talentosos. Gravou de Assis Valente a Caetano Veloso, e conseguiu pelo menos mais um sucesso comparável a “Manhãs de Setembro” e “Paralelas”: “Mudanças” (1979), parceria com Sérgio Sá, em que retorna ao mote da mulher em busca de superação: “Hoje eu vou mudar/ vasculhar minhas gavetas/ jogar fora sentimentos/ e ressentimentos tolos”.
Ela abriu espaço na agenda para seu lado de atriz. Já tinha alguns trabalhos no currículo, inclusive o musical “Hair”, e em 1977 encabeçou o elenco de “Cinderela 77”. Nesta novela da TV Tupi, em clima de conto de fada, Vanusa fez par romântico com Ronnie Von. Seu ritmo de trabalho foi diminuindo gradativamente, gravando pouco, e ela sentiu a perda do marido e do ex. Antônio Marcos morreu em 1992, aos 46 anos, de insuficiência hepática. Vannucci morreu no mesmo ano, aos 58 anos, de isquemia cerebral. Em 2009, Vanusa protagonizou um episódio vexatório num evento na Assembleia Legislativa de São Paulo. Ela cantou o hino nacional de forma bizarra, errando a letra e desafinando, e o vídeo explodiu na internet. Boatos de que estaria bêbada ou drogada foram espalhados. A cantora disse que estava sob efeito de um remédio muito forte para labirintite.
Ela enfrentava há tempos uma forte depressão. No ano seguinte, Vanussa teve outra apresentação problemática, num show em Manaus. Ela errou completamente as letras de duas músicas em seguida, novamente viralizando na rede. Em 2015, a cantora teve um novo momento de brilho com o álbum de inéditas “Vanusa Santos Flores”, projeto criado para ela por Zeca Baleiro. Lançado pelo selo do cantor, Saravá Discos, o álbum tem canções de compositores como Angela Ro Ro, Zé Ramalho e o próprio Baleiro. Pouco tempo depois, Vanusa começou a mostrar sinais de Alzheimer, interrompendo uma carreira de 18 álbuns e um reconhecimento popular que transformou seu nome em sinônimo de mulher loira e bonita. E também uma cantora extraordinária.
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