Lei Paulo Gustavo em SP priorizará produtoras já consolidadas no mercado
A decisão, porém, sofre resistência de agentes culturais, que temem uma concentração do dinheiro em grandes nomes da capital paulista
A Secretaria da Cultura de São Paulo deve priorizar produtoras de audiovisual já estabelecidas no mercado na distribuição de recursos da Lei Paulo Gustavo para a produção de longas-metragens.
A decisão, porém, sofre resistência de agentes culturais, que temem uma concentração do dinheiro em grandes nomes da capital paulista. Para eles, essa medida contraria o objetivo da lei e pode diminuir a diversidade de narrativas.
Secretária da Cultura, Economia e Indústria Criativa, Marilia Marton afirma que a escolha é uma forma de garantir que o dinheiro vá para profissionais que de fato consigam produzir longas-metragens.
Dessa maneira, diz ela, seria possível evitar que a pessoa receba o dinheiro, mas não finalize o projeto.”Os recursos não são voltados para os grandes, mas para aqueles que tenham expertise para realizar um longa”, afirma Marton.
A secretaria diz que haverá um módulo voltado para filmes de baixo orçamento, área na qual quem não tem um currículo volumoso pode concorrer.
“Agora, longa com orçamento cheio não dá. Não tem como eu acordar hoje e falar: ‘Virei cineasta'” diz ela. “Projeto de fomento não é distribuição de renda. Projeto de fomento é para estimular a indústria criativa.”
São Paulo é a região do país que receberá mais recursos da Lei Paulo Gustavo, medida criada para ajudar o setor cultural a se recuperar dos prejuízos causados pela pandemia. Serão por volta de R$ 356 milhões para o estado e R$ 372,4 milhões para as suas 645 cidades, totalizando R$ 728,7 milhões.
Dos recursos repassados ao governo estadual, cerca de R$ 60 milhões devem ir para quinze projetos de longa-metragem. A seleção acontecerá em três etapas.
A primeira consiste na apresentação de um portfólio com as obras realizadas pela produtora que está pleiteando os recursos. Esse currículo será avaliado por um grupo formado por acadêmicos e especialistas no mercado. A segunda fase é de natureza burocrática e terá uma comissão da Secretaria da Cultura, que avaliará os documentos dos proponentes. A última é o chamado pitching, uma novidade para acessar leis de fomento em São Paulo.
Muito comum no audiovisual americano, o pitching é uma apresentação de, no máximo, dez minutos sobre um projeto audiovisual. O objetivo é que o idealizador da obra mostre ao mercado que a ideia é boa e merece receber investimentos.
A intenção da Secretaria da Cultura é chamar profissionais de empresas como Netflix e HBO para integrar a banca avaliadora. “Estamos dando uma chance de a Netflix conhecer produtores que ela jamais teve acesso”, diz a secretária, acrescentando que o estado oferecerá cursos sobre como fazer pitching, já que a prática não é difundida no país.
No entanto, o modelo de distribuição dos recursos tem gerado desconfiança no setor cultural. Faz parte desse grupo Diego da Costa, membro da ICine, o Fórum de Cinema do Interior Paulista, entidade que congrega produtores de cerca de 104 cidades.
“O cinema de mercado está estabelecido em alguns bairros do Rio e de São Paulo. Ele não chega nem à periferia. O que vai acontecer é que poucas produtoras da capital vão acabar ficando com todos os recursos e o mesmo tipo de cinema vai seguir sendo feito.”
Costa diz que a Lei Paulo Gustavo já prevê que os recursos sejam repassados de modo a estimular a desconcentração territorial.”O dinheiro dessa medida não pode criar os super-ricos do cinema. O nosso movimento não deve ser no sentido de concentrar recursos, mas de redistribui-los”,afirma. “Por que jogar o dinheiro para quem conta as mesmas histórias?”
Pergunta parecida se faz a roteirista Maíra Oliveira, conselheira da Associação de Profissionais do Audiovisual Negro, entidade que conta com mais de 300 membros em São Paulo. Para ela, concentrar os recursos em produtoras já consolidadas é ignorar que a cultura é feita por agentes de diferentes perfis.
“Acho no mínimo cruel. Arte não é feita só nas universidades, festivais internacionais, mas também nos cineclubes e em festivais nacionais.” Ela acredita que, caso o modelo de repasse não mude, agentes culturais podem se ver sem recursos para criar suas histórias.
“Não se trata de excluir grandes produtoras, muito pelo contrário, mas, sim, de incluir produtoras de pequeno e médio porte. Até porque elas foram as mais impactadas pela pandemia e pelo desmonte da cultura.”
Em maio deste ano, a ministra Margareth Menezes anunciou o repasse de R$ 3,8 bilhões para os estados, o Distrito Federal, além de todos os 5.570 municípios brasileiros.
Do total de recursos disponibilizados, R$ 2 bilhões serão destinados aos estados e R$ 1,8 bilhão aos municípios.
São eles que ficarão responsáveis pelo repasse do dinheiro. Cabe a esses entes federados executar editais, chamamentos públicos e elaborar prêmios para distribuir os recursos.
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