Caso Richthofen ganha dois filmes com pontos de vista de Suzane e de Daniel Cravinhos
"A Menina que Matou os Pais" e "O Menino que Matou Meus Pais" chegarão simultaneamente aos cinemas brasileiros no primeiro semestre de 2020
Brooklin, zona sul de São Paulo, 2002. Os irmãos Daniel e Cristian Cravinhos entram no casarão onde morava Suzane von Richthofen e matam os pais dela, Manfred e Marísia von Richthofen.
Parque Ibirapuera, 2019. Os atores Leonardo Bittencourt e Carla Diaz reencenam o primeiro encontro entre Daniel e Suzane, o ponto de partida para aquele que se tornaria um dos assassinatos mais midiáticos do país.
A cena faz parte de um projeto cinematográfico que quer recontar a história do casal e do crime pelo qual ganhou fama. Um não, dois. Serão dois filmes a narrar, de diferentes pontos de vista, o início do namoro e o subsequente assassinato naquele outubro de 2002.
“A Menina que Matou os Pais” e “O Menino que Matou Meus Pais” chegarão simultaneamente aos cinemas brasileiros no primeiro semestre de 2020. Complementares, as obras devem ser exibidas em sessões alternadas e duplas.
Como os títulos sugerem, o primeiro longa vai narrar os acontecimentos entre 1999 e 2006, ano do julgamento do caso, pela perspectiva de Suzane, enquanto o segundo apresentará o ponto de vista de Daniel na mesma janela temporal.
Mas o projeto não tem conexão direta com os réus –os roteiros foram inteiramente baseados nos autos do processo que os condenou a quase 40 anos de prisão. Devido a contradições nos depoimentos de Suzane e Daniel, surgiu a dúvida: em quem acreditar?
Foi então que os produtores Marcelo Braga e Gabriel Gurman, ao lado do diretor Maurício Eça, tiveram a ideia de não escolher um dos lados, mas levar os dois para as telas.
“Cada filme vai trazer a narração baseada no que cada réu disse. Teremos cenas espelho, nas quais o espectador vai perceber diferenças”, explica Braga. “Conhecer os dois pontos de vista vai ser estimulante, porque todos já sabem o final da história, mas nos preocupamos com seu começo e meio”, complementa Gurman.
Também responsável pela distribuidora Galeria, o coprodutor conta que os desafios de mostrar os dois lados não se resumem à parte criativa. Daqui a alguns meses, ele enfrentará a tarefa de conquistar público para duas tramas que, a priori, podem parecer iguais.
“Estamos bolando estratégias e pensando em materiais que deixem bem clara a complementaridade dos longas”, diz Gurman. “Por mais que os dois se resolvam independentemente, você só consegue entender a história de verdade assistindo a ambos.”
Abordagem e distribuição ambiciosas se juntam ao arrojado orçamento, na ordem dos R$ 8 milhões, valor considerado alto para produções nacionais –é importante ressaltar, no entanto, que o dinheiro será utilizado para financiar os dois títulos.
Autorizados a receber cerca de R$ 2 milhões do Fundo Setorial do Audiovisual, os produtores resolveram abrir mão de verba e financiar sozinhos os longas, depois de perceberem que o investimento público em um filme de assunto controverso poderia gerar reações hostis.
A decisão parece ter sido acertada, já que notícias falsas que alegam que Suzane receberá parte do dinheiro orçado vêm inundando a internet desde o anúncio do projeto.
“Seria difícil fazer uma obra como essa com verba pública no contexto atual do país, de polarização”, diz Braga. Distribuidora e produtora, então, se uniram para bancar a produção. “É um modelo [de financiamento] mais contextualizado com o cenário atual.”
A ideia é recuperar o investimento com bilheteria e outros negócios, como a disponibilização das obras em plataformas sob demanda –tanto em formato cinematográfico quanto televisivo, dividido por episódios e com cenas extras.
“Eu acredito que a tendência no país é buscarmos formas alternativas de financiamento. Mas o investimento público é necessário para que a indústria exista”, diz Gurman.
Na esteira das inverdades sobre o envolvimento de Suzane, apareceram também alegações de que a equipe teria se encontrado com os condenados. Escolhida para interpretar a protagonista após um processo que durou dois anos, Carla Diaz deixa claro que não teve relação com qualquer personagem do caso.
“Todo mundo já tem uma imagem da Suzane, mas também existe no filme uma parte de criação, em que a gente teve certa liberdade”, diz.
Nas telas, ela será filha de Vera Zimmermann, escolhida para o papel de Marísia.
Para se preparar, Diaz leu os autos, ouviu áudios e viu vídeos da investigação. Também esteve em contato com a criminóloga Ilana Casoy, autora de dois livros sobre o caso e que assina os roteiros junto com Raphael Montes, escritor de ficções policiais.
De acordo com o diretor, Casoy foi escolhida a dedo para garantir que a reconstituição fosse a mais fiel possível –não apenas a do crime em si, mas de tudo o que veio antes.
“É um caso polêmico, mas o que de fato me atraiu nele foi essa história de amor letal entre a Suzane e o Daniel”, explica Eça. “Não vamos endeusar ninguém, vamos contar o que ninguém viu. E não tem o que justificar ou defender, eles são réus confessos, isso está resolvido.”
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