Pastor da igreja protestante mais antiga de SP critica ações de Doria e Crivella
Valdinei Ferreira, à frente do mais antigo templo protestante da capital paulista, a Primeira Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo, fez críticas ao governador paulista e ao prefeito carioca
Governantes jamais devem se valer do Estado “para impor qualquer tipo de moralidade cristã à sociedade”. A recomendação partiu do pastor Valdinei Ferreira, à frente do mais antigo templo protestante da capital paulista, a Primeira Igreja Presbiteriana Independente de São Paulo, de 1865. E os alvos eram explícitos: o prefeito carioca, Marcelo Crivella (PRB), e o governador paulista, João Doria (PSDB).
Em culto na Catedral Evangélica de São Paulo, no domingo (15), Ferreira pregou: “O estilo de vida cristão é fruto de uma escolha do coração, jamais da coerção”.
No início da pregação, o líder evangélico explicou aos fiéis o contexto de sua fala: o envio, à Bienal do Livro, de fiscais da Prefeitura do Rio para censurar um gibi com dois super-heróis homens se beijando, e a ordem de Doria para recolher material escolar que abordava questões de identidade de gênero.
“Embora eles argumentem que agiram com base nas leis do Brasil [ECA e legislação que regulamenta a área educacional], o contexto motivador da ação é a sinalização para parte do eleitorado cristão que vê com bons olhos o uso do Estado para o enquadramento da sociedade naquilo que julgam ser uma moralidade cristã na área dos costumes”, disse o pastor à Folha de S.Paulo.
Na igreja, ele questionou o que estaria por trás da ação dos dois políticos. “Como não nasci ontem, também sei que no cenário mais amplo está uma determinada visão de mundo que é informada religiosamente. Não vem ao caso aqui se a motivação religiosa por detrás das ações é genuína ou apenas para agradar determinado eleitorado.”
Doria e Crivella, continuou, seriam apenas casos ilustrativos de uma questão mais extensa: “Faz parte da vontade divina que autoridades da esfera civil fomentem comportamentos da moralidade sexual? Cristãos, enquanto cidadãos, devem pressionar autoridades civis para que as leis e as políticas públicas estejam alinhadas o máximo possível com suas convicções religiosas, ou seja, com aquilo que entendem ser a vontade de Deus para a sociedade?”.
Ferreira acha que não. Ele lembrou de dois ícones da Reforma Protestante, que há 502 anos provocou um cisma no cristianismo (então predominantemente católico). Martinho Lutero e João Calvino “trataram de separar Estado e Igreja, separar a esfera de governo temporal da esfera de governo espiritual”, apontou.
Está certo que, para Ferreira, o ponto de vista bíblico é claro: “Homem e mulher foram criados por Deus, o casamento entre homem e mulher foi instituído por Deus e exclusividade entre marido e mulher é intenção divina também”.
Mas vivemos numa sociedade laica e, “no que diz respeito à homossexualidade, em 2010, o Supremo Tribunal Federal definiu como constitucional a união civil entre pessoas do mesmo sexo”, afirmou. Ele também resgatou a decisão de junho de 2019 do STF que equiparou a homofobia aos crimes de racismo.
“O ministro Celso de Mello sensatamente frisou em seu voto que as religiões têm o direito de expressar opinião contrária à prática da homossexualidade, desde que isso não consista em incitação ao ódio.”
Ferreira é conhecido por suas manifestações políticas, ainda quem sem cravar um lado na discussão (se o fiel deveria votar em fulano ou sicrano, por exemplo).
Em entrevista dias após o segundo turno da eleição presidencial, o líder presbiteriano disse que cristãos precisam enfrentar esquemas conspiratórios à direita (como a Ursal, uma ficcional frente socialista no continente) e à esquerda (a de que o ministro Sergio Moro seria agente da CIA).
Três dias após a vitória de Jair Bolsonaro, o pastor assinou um manifesto em nome do movimento Reforma Brasil pedindo que cristãos se posicionem “de modo intransigente a favor da institucionalidade democrática”.
Um ano antes, a mesma frente, sob liderança de sua igreja, divulgava um manifesto contra “cadáveres da política” e crítico à bancada evangélica (que tem presbiterianos de outras alas entre os seus pares).
A cena política era então descrita como um “vale de ossos secos”, recuperando a expressão do profeta bíblico Ezequiel, “dominado por legiões de mortos-vivos, instalados nos centros de poder”.
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