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Grupo com 100 pessoas faz vigília em ponte de Natal para evitar suicídios

O acampamento começou com apenas quatro voluntários. Hoje, aproximadamente cem pessoas participam de escalas fixas que revezam grupos de sentinelas e pessoal de apoio a cada seis horas


Por Folhapress Publicado 16/05/2019
Divulgação

“Perdi meu pai para a depressão. Estar aqui é uma tentativa de evitar que outras famílias passem pela dor que eu passei.” O relato é do desempregado Hélio Dantas Gomes, 33, que se juntou ao grupo que faz vigília para tentar evitar suicídios na ponte Newton Navarro, em Natal (RN).
O trabalho voluntário teve início em 21 de abril e, nesse período, já abordou no local cerca de cem pessoas que cometeriam suicídio na ponte mais alta da capital do Rio Grande do Norte. No ponto mais alto do vão central -de onde se avista a Fortaleza dos Reis Magos, um dos principais cartões postais do Nordeste -a estrutura chega a uma altura de 60 metros.
O acampamento começou com apenas quatro voluntários. Hoje, aproximadamente cem pessoas participam de escalas fixas que revezam grupos de sentinelas e pessoal de apoio a cada seis horas. Usando coletes sinalizados e rádios, os voluntários monitoram, em seis pontos de apoio, os 1.300 metros de extensão da ponte.
Aurélio de Lima, 37, também está na escala de vigilantes e faz plantão de seis horas, cinco dias por semana. “Fiquei assustado com a quantidade de tentativas de suicídio. O caso é mais sério do que imaginava”.
A Secretaria de Estado da Segurança Pública não divulga dados estatísticos sobre a quantidade de suicídios na ponte, mas informou que o local registra 1% dos casos nos últimos oito anos no estado -quando teve início a série histórica.
A ideia da vigília foi do pastor evangélico Rubens Medeiros. Ele já tentava chamar atenção para a falta de segurança do local desde 2017, quando passou a realizar encontros religiosos na área. Ele disse que não conseguiu constituir um grupo para iniciar o acampamento na primeira tentativa.
“Também não consegui sensibilizar as autoridades para o problema.” No dia 19 de abril, quando ele disse ter sonhado com o filho saltando da ponte, decidiu montar o acampamento mesmo sem equipe formada ou estrutura.
O pastor conta que no primeiro dia foram abordadas três pessoas que afirmaram estar na ponte para tentar pular. No segundo, outros 11 casos. “O dia mais difícil foi o terceiro dia. Quando paramos para almoçar, um motociclista entrou no acampamento desesperado dizendo que um rapaz havia se jogado.” O corpo foi encontrado no dia seguinte.
Segundo o levantamento dos Sentinelas de Cristo, como gostam de ser chamados, esse foi o único caso de morte no local em 20 dias.
Em novembro de 2018, o juiz Bruno Montenegro Ribeiro Dantas, da 5ª Vara da Fazenda Pública de Natal, determinou que estado e município fizessem melhorias na estrutura e na segurança da ponte. Entre as providências estava a implantação, em seis meses, de tela de proteção sob o vão central da ponte, sob pena de multa única de R$ 1 milhão à Prefeitura de Natal.
A administração alega que o município não foi notificado oficialmente da decisão e que, quando isso acontecer, vai recorrer, já que a estrutura não é de responsabilidade do município. A assessoria do governo estadual não detalhou providências para cumprir as determinações.
AUXÍLIO
O acampamento começou a crescer a partir do terceiro dia. Medeiros fez um vídeo reclamando da falta de segurança no local e postou em redes sociais, o que bastou para começarem a surgir voluntários e doações.
A estrutura do acampamento já conta com quatro tendas grandes: duas usadas como dormitórios, uma como cozinha e outra para equipe de apoio. Os equipamentos de comunicação são guardados em uma velha Kombi. Há, também, banheiros químicos e duas motocicletas utilizadas para fazer ronda e uma pequena casa alugada nas proximidades para apoio da equipe.
Tudo o que existe no local foi doado. As tendas são da equipe da Cruz Vermelha de Natal, a energia foi puxada da casa da comunidade e a água e a comida são de doações que chegam a todo instante levadas pela população. Além de doações, o grupo recebe muito apoio. A maioria dos motoristas que trafegam pela ponte saúda o grupo com acenos e buzinadas.
A vigília não é o primeiro projeto para tentar impedir que as pessoas se joguem do local. Em 2018, a professora de educação física Leila Maia, 31, buscou ajuda de psicólogos para escolher frases de amor à vida e fixou 20 placas na grade do ponto mais alto da ponte.
O trabalho foi batizado de Ponte da Vida. Leila conta que a questão do suicídio sempre foi um tabu na família. “Meu pai cometeu suicídio quando eu tinha seis anos. Procurei ajuda psicológica para entender essa situação de forma responsável. Achei que essa mesma ajuda poderia ser estendida a outras pessoas”, disse. A ideia das placas na ponte de Natal foi implantada após a morte de um amigo dela no local.
Neste ano, o projeto cresceu e outras 60 placas foram fixadas. Com a vigília, as duas ideias se fundem. “Estamos juntando forças para tentar trazer mais segurança para esse local. Mas ainda não temos respostas concretas do poder público”, disse a professora.
Nas proximidades da ponte não há nenhum posto de fiscalização de órgãos municipais ou estaduais. Também não há sistema específico de monitoria eletrônica. A estrutura foi construída pelo governo do estado com recursos federais.
Nos últimos 20 dias, o pastor já se reuniu com o prefeito Álvaro Dias (MDB) e com a governadora Fátima Bezerra (PT), mas nenhuma ação real foi feita para garantir mais segurança na ponte. “Só vamos sair daqui quando o poder público colocar segurança 24 horas”, afirmou o pastor.

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