Morador de Sorocaba é condenado por crime de discriminação racial na internet
De acordo com a denúncia, o réu publicou, em duas ocasiões, comentários em matérias jornalísticas com conteúdo discriminatório e preconceituoso contra o povo nordestino
A juíza federal Sylvia Marlene de Castro Figueiredo, da 3ª Vara Federal em Sorocaba (SP), condenou um morador da cidade do interior paulista pelo crime de discriminação racial praticado pela internet. De acordo com a denúncia, a pessoa publicou, em duas ocasiões, comentários em matérias jornalísticas com conteúdo discriminatório/preconceituoso contra o povo nordestino. A denúncia foi recebida em 30 de julho de 2018.
As informações foram divulgadas pelo Núcleo de Comunicação Social da Justiça Federal em São Paulo – Processo n.º 0002194-24 2018.4.03.6110. As matérias, de acordo com a denúncia do Ministério Público Federal, continham os seguintes comentários do réu:
25/10/2015: “Nordestino não precisa de carteira, não tem dinheiro pra nada, a não ser se for o dinheiro do bolsa família! Moeda! Aposto que era moeda de 5 centavo que sobro quando ele compro o passe de ônibus”.
26/02/2016: “Não senhor, vai estudar, tá pensando que aqui é Pernambuco é?!” e “Amaldiçoado seja o povo do Nordeste!!! Culpa de termos esta presidente é toda suas!”
De acordo com o Ministério Público Federal, a matéria jornalística de 2015, na qual o acusado teria publicado a manifestação de cunho discriminatório, noticiava que um estudante potiguar, em Natal/RN, teria sido eliminado do ENEM – Exame Nacional do Ensino Médio por portar uma moeda em sua carteira que foi identificada pelo detector de metais no momento em que foi ao banheiro.
Em seguida, o acusado teria feito o comentário de cunho discriminatório. A defesa do réu pediu a incompetência do Juízo, quanto aos fatos referentes à conduta realizada em 2015, pois foi direcionada a uma só pessoa, na esteira do posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça que entende “ser de competência da Justiça Estadual processar e julgar a ofensa pela internet, ainda que o agente se utilize de palavras discriminatórias, desde que direcionada à pessoa determinada”.
Segundo a juíza, ficou comprovado, porém, que a mensagem do acusado possui conteúdo ofensivo a um grupo, pois referia-se aos nordestinos de forma genérica. “Mais do que a eventual lesão ao direito do indivíduo, implica a discriminação ou preconceito a um determinado grupo de pessoas”. Quanto à manifestação do acusado em 2016, a defesa alegou que “a liberdade de expressão é garantida pela Constituição Federal e que os comentários tecidos pelo acusado expressavam apenas a revolta e indignação com a situação política e econômica do País, não tendo por intenção disseminar o ódio em face da região nordeste”.
A juíza Sylvia Marlene de Castro Figueiredo lembrou em sua decisão, que “o conteúdo destas mensagens não está inserido nos limites da liberdade de manifestação de pensamento, assegurada como direito fundamental, desbordando do razoável – mesmo visto sob o prisma da tolerância […]. As condutas do acusado extrapolam o direito à liberdade de expressão”.
“Some-se a isso o fato de que o réu, em outras ocasiões, conforme apurado nos autos, manifestou-se de forma discriminatória/preconceituosa em relação à população do nordeste, revelando seu desprezo pelas pessoas de determinada procedência regional”, assevera a magistrada.
Verifica-se, assim, que a pessoa “ultrapassou o limite jurídico que norteia as pessoas em sua vida social, ultrapassando, também, os limites constitucionais e internacionais de sua liberdade de expressão.”
Segundo a juíza, “ainda que o sistema normativo não possa tutelar o pensamento das pessoas, a manifestação do pensamento pode ser punida quando, pelo excesso, envolver preconceitos ou discriminações de origem, raça, sexo, cor e idade, dentre outros aspectos da personalidade, mormente pelo fato de que, atualmente, a rápida difusão dessas manifestações é proporcionada pela utilização de meios digitais (redes sociais)”
O réu foi condenado pelo crime de discriminação racial – artigo 20, caput e §2º, da Lei 7.716/1989, com redação dada pela Lei nº 9.459/1997. A juíza substituiu a pena privativa de liberdade de 2 anos e 4 meses de reclusão por duas penas restritivas de direitos, sendo uma de prestação pecuniária e outra de prestação de serviços à comunidade.
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