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Morre Orlando Brito, um dos maiores fotógrafos a retratar a ditadura militar

De Castello Branco a Bolsonaro, não há um só político brasileiro importante que tenha escapado ao seu olhar


Por Folhapress Publicado 11/03/2022
Morre Orlando Brito, um dos maiores fotógrafos a retratar a ditadura militar
Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

O fotógrafo Orlando Brito morreu aos 72 anos nesta sexta (11). Ele estava internado no Hospital Regional de Taguatinga, na região metropolitana de Brasília. Um dos mais importantes fotojornalistas brasileiros, conhecido por sua longa trajetória cobrindo política na capital federal, ele morreu em decorrência de uma infecção após cirurgia no intestino.


Natural de Janaúba (MG), chegou a Brasília ainda criança, no “empoeirado Natal de 1956”, quando se iniciava a construção da nova capital. Autodidata, iniciou sua carreira em 1964 como laboratorista da sucursal brasiliense do jornal carioca Última Hora e, em 1966, já cobria os primeiros anos do regime militar. Ao longo de sua prolífica carreira, atuou como fotógrafo ou editor de fotografia em publicações como O Globo, Jornal do Brasil, Veja e Caras. Nos últimos anos dedicou-se à sua própria agência de notícias, a ObritoNews.


Embora tenha realizado reportagens em diversas partes do país, foi em Brasília que sua verdadeira vocação se revelou. Ali, fotografando os círculos do poder, entre presidentes, políticos, militares e empresários, construiu uma obra única, capaz de contar a história do Brasil, desde o golpe de 1964 até hoje, através da política e de seus protagonistas. De Castello Branco a Bolsonaro, não há um só político brasileiro importante que tenha escapado ao seu olhar.


Brito circulou com desenvoltura tanto entre os generais do regime militar – que ele chamava de “revolução” – quanto entre os presidentes que vieram depois. Como todo profissional que cobre diretamente a política, teve que conjugar o dever do ofício, os interesses dos veículos para os quais trabalhava e os limites impostos pelo governo de turno – uma equação especialmente delicada durante a ditadura, onde a liberdade de expressão era fortemente cerceada.


Suas principais imagens da política brasileira foram reunidas no livro “Poder, Glória e Solidão”, lançado em 2002. Organizado de forma cronológica, com mais de 300 fotografias, a obra contém imagens históricas, inclusive algumas que não puderam ser publicadas à época. Há generais de óculos escuros desfilando nas rampas desenhadas por Oscar Niemeyer, um melancólico presidente Figueiredo em seu cavalo, a silhueta inconfundível de Ulysses Guimarães, o palanque das Diretas Já, Sarney, Collor, FHC e Lula. É um trabalho que documenta de forma ininterrupta a longa e dolorosa reconquista da democracia brasileira que, segundo o próprio fotógrafo, está hoje novamente ameaçada.


Brito fez escola na fotografia política de Brasília, onde há uma tensão constante entre o que os políticos querem que seja mostrado, e o que realmente está acontecendo. Nesse ambiente engessado, o fotógrafo age como uma cobra pronta para dar o bote. Está sempre em busca do inesperado, das brechas, dos vacilos, de momentos fugidios que frequentemente significam mais do que as poses oficiais. Suas melhores imagens são resultado desse misto de paciência e agilidade, como na famosa fotografia conhecida como “Dança das Cadeiras”, onde Figueiredo, Delfim, Newton Cruz e Golbery se preparam para uma reunião.


Retratou o Brasil também fora dos palácios. Fotografou presidentes com o mesmo interesse que dedicou aos retirantes, manifestantes, indígenas e trabalhadores. Dedicou-se ao fotojornalismo humanista, alinhado aos grandes mestres do século 20, como Henri Cartier-Bresson e Sebastião Salgado.


Fotografou festas populares e religiosas, sobretudo no Nordeste. Ali, diferentemente dos gabinetes de Brasília, pôde desenvolver legítimas relações de confiança e empatia com seus retratados. Essas imagens foram reunidas no livro “Corpo e Alma” (2006).


Publicou ainda “Perfil do Poder” em 1981, “Senhoras e Senhores” em 1992, “Brasil: de Castello a Fernandos”, em 1996, e “Iluminada Capital”, em 2003. Viajou por mais de 60 países e foi o primeiro brasileiro a receber o World Press Photo, um dos mais importantes prêmios do fotojornalismo mundial, em 1979. Conquistou onze vezes o Prêmio Abril de Fotografia, sendo considerado hors-concours a partir de 1987. Em 1991, recebeu uma bolsa da Fundação Vitae para a realização de um projeto em que retratou pessoas famosas com mais de 80 anos. Suas fotos estão em diversas coleções públicas e privadas.


Tinha uma visão clara do papel de jornalista: “Fotógrafo vê a morte sem chorar, a vitória sem aplaudir, o perigo sem temer e a piada sem sorrir”, dizia. Brito esteve muito próximo dos círculos de poder e tinha consciência desse acesso privilegiado. Passou boa parte da vida em meio a personalidades centrais de nossa história, mas nunca se esqueceu daquilo que chamava de “compromisso com as pessoas ausentes”.

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