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Banco Central eleva Selic em 1,5 ponto e juros voltam aos dois dígitos após quase 5 anos

Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central elevou a taxa básica de juros de 9,25% para 10,75% ao ano


Por Folhapress Publicado 03/02/2022
Banco Central eleva Selic em 1,5 ponto e juros voltam aos dois dígitos após quase 5 anos
Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

O Copom (Comitê de Política Monetária) do Banco Central elevou a taxa básica de juros de 9,25% para 10,75% ao ano nesta quarta-feira (2). Desde julho de 2017, a taxa Selic estava abaixo dos dois dígitos, período em que foi reduzida diante de uma inflação em queda e uma atividade econômica praticamente estagnada.


O BC também sinalizou que o ciclo de aperto iniciado em março do ano passado não chegou ao fim, diante de uma inflação ainda resistente e que ameaça estourar a meta pelo segundo ano seguido.


Mas disse em seu comunicado que, em relação aos seus próximos passos, o comitê antevê como mais adequada, neste momento, a redução do ritmo de ajuste da taxa básica de juros em sua próxima reunião.


Segundo o Copom, essa sinalização reflete o fato de que os efeitos cumulativos do ciclo de aperto monetário ainda se manifestarão ao longo dos próximos meses.


Na reunião anterior, em dezembro, o BC também elevou a taxa em 1,5 ponto percentual e indicou que faria nova alta da mesma magnitude neste início de ano. Por isso, todos os analistas consultados pela Bloomberg já esperavam esse aumento. O comitê volta a se reunir agora nos dias 15 e 16 de março.


O ciclo de aumento dos juros no Brasil – oito altas seguidas, totalizando 8,75 ponto percentual – é o maior entre as principais economias do planeta. Em março do ano passado, a taxa básica estava em 2% ao ano, menor patamar desde a criação do Copom, em 1996.


A Selic está agora no maior patamar desde maio de 2017, ainda no governo de Michel Temer (MDB), quando os juros eram de 11,25% ao ano.


Esse é também o maior ciclo de aperto desde a criação do sistema de metas de inflação, quando a taxa básica subiu de 25% para 45% ao ano, em março de 1999, diante do fim do regime de câmbio fixo.


A alta de 8,75 pontos percentuais desde o ano passado também supera o aumento de 8,50 pontos visto de outubro de 2002 a maio de 2003, na transição entre os governos FHC e Lula.


De acordo com o relatório Focus desta semana, em que o BC divulga projeções do mercado, economistas esperam que os juros fechem 2022 a 11,75% ao ano. Em 2023, cairia para 8% ao ano.

O choque de juros é uma resposta do BC à escalada de preços observada desde o fim do ano passado e às sucessivas revisões para cima das expectativas de inflação para o próximo ano.

“O Copom enfatiza que os passos futuros da política monetária poderão ser ajustados para assegurar a convergência da inflação para suas metas, e dependerão da evolução da atividade econômica, do balanço de riscos e das projeções e expectativas de inflação para o horizonte relevante da política monetária”, disse o comitê em seu comunicado desta quarta.


O Copom considera que, diante do aumento de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas de inflação para os próximos anos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário avance significativamente em território contracionista.


“O Comitê enfatiza que irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.”


Segundo o BC, uma possível reversão, ainda que parcial, do aumento nos preços das commodities internacionais em moeda local produziria trajetória de inflação abaixo do cenário de referência. Por outro lado, diz a instituição, políticas fiscais que impliquem impulso adicional da demanda ou piorem a trajetória fiscal futura podem impactar negativamente preços e o prêmio de risco do país.

Para a instituição, apesar do desempenho mais positivo das contas públicas em 2021, a incerteza em relação ao arcabouço fiscal segue mantendo elevado o risco de desancoragem das expectativas de inflação.


O Brasil fechou 2021 com a quarta maior inflação entre 44 economias destacadas pela OCDE e deve terminar 2022 entre as nove maiores taxas ao consumidor, segundo projeções e dados coletados pela instituição que reúne as economias mais relevantes do planeta.


Além disso, o IPCA (índice de preços ao consumidor) deve superar a meta de inflação pelo segundo ano seguido. As projeções de mercado coletadas na pesquisa Focus são de uma taxa de 5,38% em 2022, sendo que a meta é de 3,50%, com limite de tolerância até 5%. No ano passado, a inflação foi de 10,06%, para um limite de 5,25%.


As projeções divulgadas pelo BC nesta quarta são de 5,4% para 2022 e 3,2% para 2023. Em sua avaliação do cenário atual, o Copom afirmou que no cenário externo, o ambiente segue menos favorável, pois a maior persistência inflacionária aumenta o risco de um aperto monetário mais célere nos EUA, tornando as condições financeiras mais desafiadoras para economias emergentes.


Além disso, a nova onda da covid-19 adiciona incerteza quanto ao ritmo da atividade, ao mesmo tempo que pode postergar a normalização das cadeias globais de produção, segundo o comitê.


Em relação à economia brasileira, diz que indicadores relativos ao quarto trimestre tiveram evolução ligeiramente melhor que a esperada, em particular os relativos ao mercado de trabalho. Já a inflação ao consumidor seguiu surpreendendo negativamente e diversas medidas apresentam-se acima do intervalo compatível com o cumprimento da meta.


Na carta aberta divulgada no mês passado para explicar o não cumprimento da meta, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, atribuiu o resultado a sucessivos choques de custos, como elevação do preço de commodities junto com a depreciação do real, bandeira de escassez hídrica na energia elétrica e desequilíbrio entre demanda e oferta de insumos, além de gargalos nas cadeias produtivas globais gerados pela pandemia.


Rafael Ihara, economista-chefe da Meraki Capital, afirma que a redução no ritmo de alta dos juros a partir de março está de acordo com as expectativas do mercado. Ele projeta uma alta de mais 1 ponto percentual, para 11,75%, no mês que vem, e um aumento de mais 0,50 ponto, para 12,25%, em maio, encerrando o ciclo de alta de juros.


“Já estava precificada uma alta menor na reunião de março. A dúvida era se ele [Copom] seria explícito ou não. Ele preferiu deixar de forma bem clara a redução de ritmo na reunião seguinte”, afirmou.


Ihara diz que, a partir de maio, o foco do BC passa a ser a inflação de 2023, dada a defasagem entre a alta de juros e seus efeitos mais fortes na economia.


Ele lembra que o país passou de uma taxa de juros real (descontada a projeção de inflação para 12 meses) de cerca de – 1% para quase 7% ao ano e que grande parte do impacto desse aperto ainda será sentido em 2022.


Para ele, o momento do início do ciclo de queda de juros vai depender agora da questão eleitoral, que pode adiar o primeiro corte para 2023.


Já Carlos Kawall, diretor da ASA Investments e ex-secretário do Tesouro, avalia que o Banco Central surpreendeu ao sinalizar que reduzirá o ritmo de aumento da Selic já na próxima reunião. “A gente imaginava que fosse deixar isso em aberto, pelo fato de, em março, ainda ter poder sobre a inflação de 2022. Mas fez uma opção mais branda, mais ‘dove’, e antecipou que vai reduzir o ritmo”, afirmou.


No jargão usado entre economistas, “dove” (pombo, em inglês) significa que a autoridade monetária adota um discurso mais brando, com intenção de cortar ou de subir menos os juros.
Kawall aponta que, se o Banco Central vier mais brando na reunião de março, com um aumento de 1 ponto, talvez tenha de fazer um novo aumento no encontro seguinte, de 0,50 ponto, dependendo da evolução da expectativa de inflação para 2023.


“Estamos bastante próximos do fim do ciclo [do aperto monetário], que poderá ocorrer na reunião de março, mas, com a redução do ritmo, talvez se estenda até a reunião de maio, com a Selic chegando a 12%, 12,25%”, afirmou.


Luiz Fernando Figueiredo, sócio-fundador da Mauá Capital e ex-diretor de política monetária do BC, avalia que o tom usado pelo Copom indica que a autarquia está dentro do seu plano de voo e, dado o estágio do aperto monetário, deve aumentar a Selic ao passo de 1 ponto percentual na próxima reunião.


“Embora esteja tendo uma boa performance fiscal, primeiro ano de superávit primário desde 2013, esse flerte com estouro do teto, não ter uma âncora fiscal razoável no ano que vem, esse risco do arcabouço fiscal aumenta o risco de ter uma desancoragem de expectativa”, analisou.

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