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Pesquisador testa vacina que esteriliza capivaras na raia da USP

A alta taxa de proliferação das capivaras, todas as consequências envolvidas na presença urbana delas e sua participação no ciclo da febre maculosa faz com que elas sejam acompanhadas com preocupação pelo poder público


Por Nani Camargo Publicado 13/05/2019
Divulgação

Na raia olímpica da Universidade de São Paulo vivem cerca de 50 capivaras, algumas adultas, outras filhotes. Alheias aos cortes das verbas de pesquisa que atingem a instituição que frequentam, elas trotam pacatamente pelo espaço de mais de 2 km de extensão, com um lago de aproximadamente 100 m de largura.
Frequentada por centenas de remadores, a raia é também laboratório do veterinário norte-americano Derek Andrew Rosenfield, que testa vacinas de inibição de fertilidade nos gigantes roedores ruivos.
Em 2013, um casal de capivaras, investido de espírito bandeirante, deixou a marginal Pinheiros na companhia de cinco filhotes e migrou para a raia olímpica. No final de 2016, quando Rosenfield iniciou a pesquisa, a grande capacidade reprodutiva dos animais já havia multiplicado a população local para 40.
Ainda que pacatas e benquistas (a mascote da Copa América no Brasil, que começa em junho, será uma delas), as capivaras trazem problemas para aqueles que frequentam a raia. Os remadores queixam-se de choques com elas na água. Elas roem cascos de madeira das canoas. As margens da raia ficam cheias de montinhos de fezes.
Além disso, as capivaras carregam muitos carrapatos (cada aracnídeo pode colocar até 8.000 ovos). Há, também, o risco de invadirem a marginal Pinheiros e causarem algum acidente –o que as separa da via é o muro de vidro construído na gestão João Doria (PSDB) e que frequentemente aparece quebrado. Como revelado pela Folha de S.Paulo, uma falha na instalação do equipamento tem gerado o estilhaçamento frequente.
A pesquisa de Rosenfield, doutorando da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP e financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), propõe método de controle populacional das capivaras menos invasivo que a castração, que demanda captura dos animais e intervenção cirúrgica e influencia no comportamento dos machos.
“A vacina provoca a formação de anticorpos que agem sobre um hormônio principal (GNRH), que tem ação sobre todos os outros hormônios subsequentemente ao longo do eixo hipotálamo-hipofisário-gonadal. Esses hormônios são associados à função reprodutiva das capivaras, e assim você provoca infertilidade tanto no macho como na fêmea”, explica Rosenfield. Em resumo, é uma vacina que gera anticorpos para bloquear o sistema reprodutivo dos animais.
Mais do que o controle populacional na Universidade de São Paulo, a pesquisa de Rosenfield mira repercussão mais ampla. A alta taxa de proliferação das capivaras, todas as consequências envolvidas na presença urbana delas e sua participação no ciclo da febre maculosa faz com que elas sejam acompanhadas com preocupação pelo poder público.
As capivaras são hospedeiras da bactéria Rickettsia rickettsii, causadora da doença. Se um carrapato-estrela não contaminado morde uma capivara infectada, ele passa a ser um transmissor da doença.
Em 2018 houve um pico no número de casos, 103, e de mortes, 56, por febre maculosa no estado de São Paulo. Em 2017 aconteceram 61 casos e 31 mortes e, no ano anterior, 64 ocorrências e 37 óbitos.
Para a bactéria da febre maculosa conseguir se manter em uma população de capivaras ela precisa de sangue fresco, ou seja, de animais que não tenham sido infectados previamente e que, portanto, não tenham desenvolvido anticorpos.
“Os filhotes, então, ajudam na manutenção da doença. A imunocontracepção promovida pelas vacinas é uma ferramenta para interromper a proliferação da doença”, afirma Rosenfield.
Segundo ele, a ideia, posteriormente, é fazer testes em uma área endêmica. Seus estudos apontam para o período de 24 meses para, com as vacinas, eliminar a febre maculosa de uma população desses roedores.
“São fofinhas, sim. Mas a cidade e o convívio com humanos não é lugar delas. Elas têm que estar no Pantanal, em áreas selvagens. Nas áreas mais habitadas, elas destroem plantações, bloqueiam caminhos, causam acidentes de carros, proliferam doenças, podem morder crianças, cachorros”, completa o pesquisador.
Diante dos problemas causados pelos mamíferos na raia, a prefeitura da USP começou a elaborar orçamentos para castrá-las.
Rosenfield elenca vantagens da imunocontracepção em relação à castração: a) pode ser aplicada à distância, com dardo, sem necessidade de captura ou de cirurgia, preservando o bem-estar dos bichos; b) funciona como dose única e é aplicável a fêmeas e machos; e c) não interfere no comportamento do macho dominante, que continua a afastar concorrentes masculinos do bando, facilitando a eliminação da bactéria da febre maculosa do grupo.
As capivaras parecem concordar. Ao avistarem Rosenfield, aproximam-se, circundam-no. Ganham um pedaço de cana-de-açúcar. Fazem um barulho de satisfação. E vão se refestelar na grama.

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