Incerteza marca as próximas etapas de vacinação em SP
A Secretaria de Estado da Saúde já pediu essa orientação ao Ministério da Saúde, sem resposta até aqui
A campanha de vacinação contra a Covid-19 em São Paulo, estado mais populoso do país com seus 44 milhões de habitantes, entrou em uma fase de incertezas importantes à frente. Há dúvidas acerca da data efetiva em que será completada a vacinação dos grupos até 60 anos de idade e como será feita a imunização a seguir, de pessoas que têm comorbidades específicas para a infecção pelo Sars-CoV-2.
Segundo o Plano Nacional de Imunização, em tese a régua para a ação dos estados e dos municípios, pessoas com comorbidades serão as prioridades assim que todas as pessoas acima de 60 anos estiverem vacinadas.
Isso dá cerca de 18 milhões de pessoas no país, talvez 4,5 milhões em São Paulo, segundo cálculos de técnicos estaduais ouvidos pela reportagem.
A questão é que não há um protocolo nacional elaborado sobre como qualificar e atender esse grupo.
A Secretaria de Estado da Saúde já pediu essa orientação ao Ministério da Saúde, sem resposta até aqui.
Estudos sobre como aferir a elegibilidade das pessoas a serem vacinadas estão sendo feitos. Há duas semanas, numa reunião do Comitê de Contingência do Coronavírus, que reúne 21 especialistas e autoridades no estado, o caso foi discutido.
Não houve consenso sobre o que fazer devido às diversas vertentes de dificuldades que se apresentaram.
Ficou evidente no debate que o uso de receitas médicas para provar o uso de remédios contra a hipertensão, por exemplo, seria inexequível e muito vulnerável a fraudes. Assim, a tendência agora será a de pedir atestados médicos validados com o Conselho Regional de Medicina, mas a ideia esbarra em diversos problemas além das falsificações que são esperadas.
Não é preciso muita criatividade para prever a criação de um mercado paralelo de atestados falsos na crise.
Outras dúvidas se colocam, contudo. Pacientes diabéticos, um dos grupos mais passíveis de complicações devido à Covid-19, seriam classificados de que forma? Porque há quem tome um comprimido de remédio por dia e aqueles que precisam fazer uso de insulina injetável constantemente.
Doentes de câncer não operados terão precedência sobre quem ainda não passou por cirurgia? Haverá gradação por gravidade do caso? Pacientes que necessitam de hemodiálise e pessoas com síndrome de Down estão na lista prioritária do Ministério da Saúde, mas como há pessoas de todas as idades com essas condições, será aplicado o critério etário hoje vigente?
Como se vê, são dúvidas complexas e os estados estão às escuras, sem orientação federal. Um ponto ainda é pacífico. Não deve haver mudança da estratégia de cobertura vacinal baseada em especificidades regionais, como surtos mais agudos em alguns pontos do estado. Isso ocorre em alguns locais do mundo, como Hong Kong, que têm um cruzamento sofisticado de incidência da infecção e rastreamento de doentes por meio de celular.
Mas, no Brasil, a ideia esbarra no preceito legal do Sistema Único de Saúde, que é o da universalidade do atendimento à população. A reportagem ouviu de autoridades estaduais de saúde que há outros temores, ainda mais urgentes. Não há certeza sobre a capacidade de a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) entregar as vacinas prometidas para os meses de abril e maio.
Neste mês, faltarão no estado cerca de 500 mil doses do imunizante da AstraZeneca/Universidade de Oxford, formulado e envasado na Fiocruz em arranjo semelhante ao que o Instituto Butantan tem com a Sinovac chinesa. Tanto o órgão federal no Rio quanto o instituto do governo paulista preveem produzir integralmente as vacinas, mas só a partir do fim do ano.
Assim, técnicos estimam que, para tudo dar certo, a remessa prevista para maio precisaria chegar a 2 milhões de doses no começo do mês, ante as quase 1,5 milhão previstas. Como fez questão de anunciar o governador João Doria (PSDB-SP) na quarta (16), sem as doses da Fiocruz não haverá vacina para todos os 2,2 milhões de pessoas entre 66 e 60 anos que moram em São Paulo e estarão elegíveis à inoculação de forma escalonada, em 21 e 29 de abril, e 6 de maio.
A Coronavac, a vacina do Butantan, até aqui representa de 70% a 80% dos imunizantes aplicados no Brasil. Mas também enfrenta problemas: terá de atrasar, devido à demora dos chineses em entregar os insumos devidos, a finalização de suas 46 milhões de doses ao Ministério da Saúde de abril para maio.
Pequim deveria ter enviado 6.000 litros do insumo da vacina para São Paulo no dia 28 de março. Agora, só irá enviar metade do volume no próximo dia 19. Com uma capacidade instalada de vacinar 1 milhão de pessoas por dia, o que falta em São Paulo e no país é dose, não seringa ou gente.
Até esta quinta (15), segundo dados do consórcio de imprensa que monitora dos números da Covid-19, São Paulo vacinou 16,2% de sua população adulta com a primeira dose de uma das duas vacinas disponíveis. Outros 7% já receberam a segunda dose. No Brasil, os índices são de 15,5% e 5,05%, respectivamente.
Há também algumas preocupações emergentes. Se for verdade que o Brasil receberá antecipadamente em abril 1 milhão de doses da vacina da Pfizer/BioNTech, São Paulo receberá 124 mil doses. Além de o número ser pífio, há a questão do armazenamento. O imunizante precisa ser ultracongelado, e só há freezers específicos para isso em cidades com hospitais mais capacitados -como São Paulo, Campinas ou Ribeirão Preto.
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