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Após reforma trabalhista, 1 a cada 10 vagas criadas é intermitente

Em dois anos foram abertos 1,124 milhão de empregos formais; desse total, 133 mil são de trabalho sem jornada ou salário fixo


Por Folhapress Publicado 21/12/2019
Pela 1ª vez, Brasil tem mais de 100 milhões de trabalhadores ocupados
Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Dois anos após a reforma trabalhista, uma em cada dez novas vagas criadas é de trabalho intermitente, que não prevê jornada fixa. Para 2020, o governo espera um crescimento desse tipo de modalidade de trabalho.

Aprovada durante a gestão do ex-presidente Michel Temer (MDB), a reforma flexibilizou a legislação trabalhista e criou esse tipo de contratação.

Nesse período, foi aberto 1,124 milhão de empregos formais. Desse total, 133 mil são de trabalho sem jornada ou salário fixo. Isso representa 11,8% da expansão do trabalho com carteira assinada.

Dados do Caged (Cadastro Geral de Empregados e Desempregados), divulgados na quinta-feira (19) pelo Ministério da Economia, mostraram que, em novembro, o trabalho intermitente representou 11,4% das novas vagas. É a maior fatia para o novo tipo de contrato desde junho, quando foi de 18%.

Segundo o governo, os números revelam que, em novembro, o trabalho nessa modalidade se concentra no setor do comércio e serviços, impulsionado pelas contratações de fim de ano, às vésperas do Natal.

O Ministério da Economia diz acreditar que, no próximo ano, o trabalho sem jornada fixa ficará mais conhecido entre os empregadores e, por isso, crescerá. “Sem perder de vista o processo de retomada da economia brasileira, que, por sua vez também tem garantido contratações em outras modalidades”, ressaltou, em nota.

Para o diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Clemente Ganz Lúcio, os modelos de contratação criados na reforma legalizaram a precarização dos empregos, que teriam se tornado frágeis e inseguros.

A avaliação inclui, além do trabalho intermitente, jornada parcial, terceirização irrestrita e contratação de autônomos.

Lúcio afirma que dois pontos fragilizam as relações de trabalho a partir da reforma: a insegurança quanto à renda acumulada ao fim de um mês e a falta de proteção social.

A reforma de 2017 liberou a possibilidade de as empresas fazerem contratações por períodos menores do que as 40 horas semanais. Todos os empregadores têm de recolher ao INSS o valor proporcional da contribuição previdenciária.

Porém, se ao fim do mês o trabalhador tiver recebido, no somatório de suas remunerações, menos de um salário mínimo (de R$ 998 neste ano), caberá a ele o pagamento da diferença ao INSS ou esse período não será considerado, seja na aposentadoria, seja na contagem da carência para o direito a benefícios por invalidez ou salário-maternidade.

“A Previdência te projete para o futuro, mas também no presente, como proteção social. Sem isso, o trabalhador está ainda mais vulnerável.”

A situação da renda, afirma o sociólogo, é mais delicada. “Há ainda uma insegurança primária, que é não saber se você tem renda, se vai ser chamado para trabalhador e quantas vezes durante o mês.”
Segundo Lúcio, a regularização de jornadas alternativas era uma necessidade, considerando que esse tipo de trabalho já existia e era informal.

Centrais sindicais têm ressalvas em relação ao tipo de contrato. Para representantes dos trabalhadores, o trabalho intermitente não deve crescer e se sobrepor ao emprego com jornada fixa.

“O [trabalho] intermitente não é o que vai fazer o país crescer. Tem o mérito de abrir vagas, mas não acredito nisso como uma forma de desenvolver o país”, disse o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna.

Para o presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores), Ricardo Patah, o trabalho intermitente, apesar de ter normas próprias, tem que ser exceção. “Num período de alto desemprego, é uma possibilidade de inclusão no mercado, mas não deve ser maioria. Isso seria precarização.”

O professor da USP e pesquisador da Fipe Hélio Zylberstajn diz que o salto nas contratações com jornada intermitente em novembro demonstra que o uso da modalidade está mais ligado ao suprimento de demanda momentânea, como se esperava antes da reforma.

“O pessoal do movimento sindical vai dizer que está precarizando, mas, se você olhar a série, a frequência vinha caindo e deu um pulo em novembro, que é justamente pelo movimento do fim do ano.”
“Esse contrato casa bem com necessidades específicas.”

Para o pesquisador, os números demonstram que o contrato atende bem momentos e situações pontuais. “Sem esse modelo, o comércio ia contratar informalmente ou acabaria não contratando.”

Zylberstajn diz considerar “parcialmente verdade” que haja pouca proteção social a esses trabalhadores. Isso porque, segundo ele, muitos dos trabalhadores, por causa de características próprias da atividade, já atuam em mais de um lugar, aumentando as chances de fechar o mês com a remuneração no salário mínimo.

“Um garçom não trabalha somente para um bufê, por exemplo, então ele certamente consegue completar o mês.”
Membro de grupo técnico do governo sobre assuntos trabalhistas, o advogado Wolnei Tadeu Ferreira disse que a fatia de contratos intermitentes nos últimos dois anos é bastante relevante e representa uma forma de proteção de empregados, que, sem essa opção, ficariam na informalidade.

“Muitos combinam o trabalho intermitente com outros empregos, por exemplo, por aplicativos. A tendência é que esse nível [11%] seja mantido.”

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