Trump consultou Bolsonaro sobre experiência do Brasil com cloroquina
Principal objetivo do telefonema de Bolsonaro a Trump foi colaboração entre os dois países para o combate à pandemia
O presidente dos EUA, Donald Trump, consultou Jair Bolsonaro sobre a experiência do Brasil no uso da cloroquina para o tratamento de pacientes com Covid-19.
Segundo o indicado à embaixada brasileira em Washington, Nestor Forster, o americano quis saber mais sobre a administração do medicamento durante conversa com Bolsonaro por telefone na quarta-feira (1º).
“O principal objetivo do telefonema de Bolsonaro a Trump era colaboração para o combate à pandemia, o que podia ser feito [pelos dois países]. Trump reiterou a oferta de colaborar com o Brasil da forma que precisarmos, e Bolsonaro se colocou à disposição dos EUA”, disse Forster à reportagem.
“Havia muito interesse de Trump pela experiência que o Brasil tem no uso de cloroquina, agora com foco no tratamento da Covid-19.”
A cloroquina -ou sua variante, a hidroxicloroquina– é prescrita para o tratamento de malária, lúpus e artrite reumatoide, mas tem sido testada no combate à infecção por coronavírus, porém, ainda sem nenhuma prova científica robusta de sua eficácia nesses casos.
Apesar disso, Trump e Bolsonaro são defensores fervorosos do uso da substância contra as infecções por coronavírus e, no Brasil, o debate ganhou contornos políticos mais fortes nas últimas semanas, dividindo aliados e adversários do presidente brasileiro.
Nos EUA, o medicamento tem sido utilizado em vários hospitais, principalmente em Nova York -o pior cenário sob a pandemia no país. Médicos afirmam que a prescrição é feita de caso a caso, com aval do paciente, que deve ser comunicado dos prós e contras sobre o uso do remédio.
No mês passado, a agência americana reguladora para medicamentos e alimentos (FDA, na sigla em inglês) emitiu uma solicitação de emergência permitindo que médicos administrassem a substância a pacientes de Covid-19 que o desejassem, mas não especificou em quais casos, como fez o Brasil.
O Ministério da Saúde brasileiro recomenda o uso do remédio a pacientes internados em estado grave.
Forster foi um dos infectados por coronavírus após a visita de Bolsonaro a Miami, no início de março, mas disse que seus sintomas, entre febre, fadiga e congestão nasal, não foram fortes e que não precisou de medicamentos. “Fiquei doente de 13 a 21 de março. Ainda estavam começando as discussões sobre cloroquina, não precisei pensar nisso.”
O diplomata, que aguarda aprovação de seu nome ao cargo pelo plenário do Senado, disse que o governo americano fez uma oferta formal de ajuda a Brasília no combate à pandemia, mas nenhuma ação concreta foi estabelecida por enquanto.
Forster refutou que haja qualquer tentativa de os EUA confiscarem carregamentos de equipamentos e insumos médicos destinados ao Brasil e disse que não viu nenhum caso em que o país tenha sido prejudicado por ação dos americanos. “Pelo contrário, está tudo bem.”
Os governadores do Maranhão, Flávio Dino, e da Bahia, Rui Costa, acusaram os EUA de terem confiscado equipamentos médicos que iriam para o Nordeste.
Forster afirma que a embaixada brasileira em Washington foi acionada pelo governo baiano mas que, após apuração do corpo diplomático, foi atestado que não havia confisco.
“Existe a faculdade de o presidente americano recorrer à Lei de Defesa da Produção, que é da época da Guerra da Coreia, para direcionar a produção para o esforço de guerra, bens considerados essenciais para a manutenção da ordem, da segurança nacional”, disse o diplomata.
“Não há uma proibição à exportação nem há confisco imediato, é uma orientação para fazer o que for possível para não faltar aqui [nos EUA]. Se isso requerer o confisco, há poderes legais para fazer isso.”
A resposta negativa se alinha ao que afirma o embaixador dos EUA no Brasil, Todd Chapman, que classificou o confisco de equipamentos médicos como “fake news” e disse que muitos fornecedores estão dizendo que os carregamentos foram bloqueados pelos EUA como desculpa para poder vendê-los mais caro a outros clientes.
Ainda sobre a guerra de insumos que tem acometido o mundo sob a pandemia, Forster afirmou que as restrições impostas por Trump à 3M, que produz máscaras N95, por exemplo, não afeta o Brasil, porque a empresa tem unidade no país.
“As máscaras que chegam ao Brasil via 3M não dependem dos EUA, visto que há filial da firma no estado de São Paulo, e essa unidade abastece não só o mercado brasileiro como outros países latino-americanos.”
Na semana passada, ao invocar a Lei de Defesa da Produção, Trump proibiu a 3M de exportar os itens para o Canadá e países da América Latina. A 3M, por sua vez, protestou, afirmando que isso teria “consequências humanitárias significativas.”
A Casa Branca e a 3M então chegaram a um acordo no domingo (5), com uma importação de máscaras da China para suprir o mercado interno, e liberação da empresa para mandar os insumos para o Canadá e para países da América Latina.
Forster diz que os produtos que saem da 3M nos EUA são “uma complementação” no caso do Brasil -visto que as máscaras são produzidas na sede de São Paulo- e que o acordo resolveu essa questão.
A avaliação do diplomata, que sempre defendeu a ideia de que a relação entre Brasil e EUA está em “uma fase excepcional”, é de que é preciso manter as conversas entre os governo para que a interlocução não esfrie durante a pandemia.
“Agora que a gente ia começar a botar para quebrar, rompeu a pandemia, o nosso desafio é não deixar a peteca cair.”
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