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Andrés Sanchez revê decepções e diz que seu ciclo no Corinthians acabou

Andrés concedeu a entrevista antes da demissão do técnico Tiago Nunes, medida que havia rechaçado muitas vezes ao longo de 2020


Por Folhapress Publicado 20/09/2020
Rodrigo Gazzanel/Agência Corinthians

A secretária de Andrés Navarro Sanchez, 56, presidente do Corinthians, o avisa por telefone sobre a presença de um empresário da Dinamarca que deseja vê-lo.
“Da Dinamarca? Eu não conheço ninguém da Dinamarca”, ele se queixa, antes de bufar e autorizar o convidado a entrar. Em seguida, pergunta se a reportagem, já de saída após a entrevista, quer ficar na sala: “Pode esperar aí se quiser. Vai ver que é para pedir alguma coisa.”

São 10h30 de terça-feira, 8 de setembro, e o celular do dirigente tem 326 mensagens não lidas: reclamações, pedidos, xingamentos e sugestões.

Deveriam ser dias mais tranquilos a pouco mais de dois meses do fim do mandato. Ele enfim anunciou, no último dia 1º, o fechamento do acordo para os naming rights do estádio, agora chamado de Neo Química Arena.

A negociação de R$ 300 milhões parcelados em 20 anos pode ser a chave para resolver a dívida com a Caixa pelo financiamento da obra. O banco cobra R$ 550 milhões. Para Andrés, o valor devido é de R$ 450 milhões. Esse é o último nó que ele pretende desatar antes da eleição marcada para 28 de novembro.

Mas não há felicidade visível no ambiente, o que condiz com sua tese de que mesmo os melhores momentos na presidência duram pouco. “Quando o time ganha um título, a alegria é indescritível por 24 horas. Depois volta tudo ao normal”, define.

Andrés concedeu a entrevista antes da demissão do técnico Tiago Nunes, medida que havia rechaçado muitas vezes ao longo de 2020. Ele diz que, por causa das negociações pela arena, não esteve tão perto do futebol recentemente quanto em outros anos.

O presidente sabe que a equipe não será campeã brasileira e, ao constatar isso, ironiza os que estão mais preocupados com o balanço financeiro do clube do que com os resultados em campo. Ele ainda se incomoda com as críticas ao resultado de 2019: déficit de R$ 177 milhões.

“Talvez nós sejamos o 10º do Campeonato Brasileiro, mas com certeza neste ano vamos ser número 1 de balanço. Isso por que eu sou um grande gestor? Não, é porque [o clube] vendeu jogador e contratou menos”, diz.

A afirmação ambiciosa encontra pouco respaldo nos últimos números divulgados. A dívida chegou a R$ 902 milhões e teve crescimento de R$ 237 milhões nos primeiros seis meses deste ano.

As contas referentes a 2019 ainda não foram votadas pelo conselho deliberativo por causa da pandemia. Embora a aprovação ou rejeição do balanço seja mais política do que técnica, os números preocupam até alguns aliados ouvidos pela reportagem.

Desde fevereiro de 2018, mais de 30 jogadores foram contratados pelo Corinthians. Alguns custaram caro e não deram o retorno esperado. O dinheiro gasto em reforços pouco produtivos e a aposta em técnicos menos rodados, como Osmar Loss, Jair Ventura e Tiago Nunes, fizeram a pressão da torcida e da oposição aumentarem ainda mais sobre o presidente.

Andrés defende que o problema no Corinthians não é a despesa. A questão seria aumentar a receita. Há duas semanas, o clube pagou três meses de salários atrasados ao elenco profissional.

Há também o componente político. Se eleger Duilio Monteiro Alves no pleito, o mesmo grupo político se garantirá no poder por pelo menos 16 anos. Começou em 2007, com a eleição de Sanchez, e iria pelo menos até 2023. Apesar do tempo comandando o clube, o movimento ainda se chama “Renovação e Transparência.”

“A transparência existe. As portas da minha sala estão abertas. Eu mostro todos os documentos a qualquer conselheiro que vier aqui”, se defende o mandatário.

Sempre há gente na recepção à sua espera: o conselheiro que deseja discutir as finanças, os empresários de jogadores e até o sócio revoltado porque o preço da cerveja no bar aumentou dez centavos. Também podem ser ex-atletas e integrantes da diretoria.

O que lhe dá ânimo é saber que isso tudo está para acabar. São 27 anos consecutivos como diretor, assessor, presidente ou figura influente da diretoria. Período iniciado em 1993, nas categorias de base.

“Meu ciclo no Corinthians acabou. Eu me sinto realizado, mas este mandato atual foi de tanta decepção que não quero mais. Prometi isso para a minha filha [Marina, 22]”, declara ele, pai também de Luca, 26.

Os três mandatos como presidente (dois de 2007 a 2011 e mais um desde 2018) são mais do que a criança Andrés Sanchez sonhou quando, aos 10 anos, jurou para a mãe, Josefa Navarro, que um dia seria diretor do Corinthians.

Foi o clube em que viveu alguns dos melhores dias de sua vida, com as vitórias em campo. Dentro dele também teve um dos piores de todos, menos dolorido apenas que a morte dos pais: o rebaixamento para a Série B em 2007. Ele assumiu o cargo antes das sete rodadas finais.

“Tive de suportar o que poucas pessoas pessoas suportariam. Quando chegamos ao clube [após a queda] cuspiram na minha cara, xingaram os meus filhos. Isso é algo que não se apaga nunca.”

Mesmo quando não esteve na presidência, o cartola foi o principal fiador dos sucessores Mario Gobbi e Roberto de Andrade. Andrés se decepcionou com ambos, mas diz ser “mais chegado” a Andrade. Chama Gobbi de amigo, embora isso não transpareça quando fala do candidato de oposição do próximo pleito.

“Eu tenho bronca do pessoal com o qual o Gobbi se aliou. Gente que ele nem sabe, mas que o chamava de ladrão. Eles fizeram bolão para adivinhar quando eu seria preso. Isso é imperdoável. A ganância desses engravatados que não gostam e não frequentam o Corinthians é incrível”, diz se exaltando, antes de bater na mesa, apagar o cigarro na xícara de café com o escudo do clube e acender mais um.

Lembrar as previsões de prisão é algo que o deixa irado. As teorias eram de que ele seria alvo, assim como a arena, em delações da Lava Jato.

O dirigente diz que não pretende terminar o mandato em 28 de novembro. Planeja se licenciar após anunciar o acordo com a Caixa. Soa como estratégia para sair por cima, mas a explicação é premiar os vices Edna Murad Hadlik e Alexandre Husni. A afirmação pode gerar desconfiança. Andrés já fez várias promessas que não se confirmaram.

Em 2013, assegurava que a venda dos naming rights se concretizaria nos meses seguintes (só aconteceu após sete anos). Também jurou que o atacante Ronaldo Fenômeno faria um jogo de despedida com a camisa alvinegra e previu que o Corinthians se tornaria um dos dez clubes de maior arrecadação no mundo.

Declarou ainda que, se voltasse à presidência, se licenciaria do mandato de deputado federal (2014-2018) –nada disso virou realidade.

Seu estilo direto e para muitos agressivo lhe rendeu inimigos no clube e críticas na imprensa. Ele as considera elitistas. “Passo como prepotente, truculento, mal-educado e não sou nada disso. Eu falo errado mesmo. Mas tenho certeza que sei me comunicar com 100% dos brasileiros.”

Nos próximos meses, para manter seu grupo político no poder, vai fazer o que mais detesta: pedir votos. Seu candidato a presidente é Duilio, que saiu da direção de futebol na semana passada.

“A primeira coisa que vou fazer [quando deixar o cargo] é tirar uns dias de férias. Depois preciso tocar a minha vida”, conclui, antes de acender um cigarro, encerrar a entrevista e pedir para o empresário dinamarquês entrar na sala.

RAIO-X
Andrés Sanchez, 56
Presidente do Corinthians eleito em duas oportunidades (2007-2011 e 2018-2020), o dirigente acumula em sua primeira passagem os títulos do Campeonato Brasileiro da Série A (2011) e da Série B (2008), além da Copa do Brasil e do Paulista em 2009. Em seu atual mandato, o clube venceu os estaduais de 2018 e 2019. Sanchez foi deputado federal pelo PT de 2015 a 2019.

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