Ato de motoboys pede taxas mais altas de apps e expõe racha político na categoria
Nas ruas, a adesão foi pequena; nem os participantes ou a Polícia Militar, que acompanhou a manifestação em diferentes pontos da capital paulista, fizeram estimativas sobre a participação
O ato de motoboys convocado para este sábado (25) em São Paulo expôs um racha político entre diferentes vertentes do movimento, apesar de a pauta reivindicatória geral ser por melhores condições de trabalho.
Nas ruas, a adesão foi pequena. Nem os participantes ou a Polícia Militar, que acompanhou a manifestação em diferentes pontos da capital paulista, fizeram estimativas sobre a participação. O protesto deste sábado evidenciou divergências de atuação e a formação de diferentes grupos.
O Sindimoto, sindicato dos motoboys, que no dia 1º mobilizou os entregadores com um carro de som pelas ruas de São Paulo, não tinha representantes neste sábado.
Em nota, a entidade disse que apoia mobilizações contra o que qualifica como precarização do trabalho, mas que não participaria da mobilização por entender que movimentos político-partidários estavam aderindo à pauta e comprometendo o discurso e as bandeiras da categoria.
“Nosso foco é a precarização e o dano social e pedimos a entregadores ficassem em casa e consumidores não fizessem pedidos”, afirmou Gilberto dos Santos, presidente licenciado do Sindimoto.
“Mas o sindicato decidiu não apoiar com carro na rua. Fizemos isso nas duas últimas manifestações, conseguimos uma abertura, mas a gente vê que há diversos grupos, alguns partidários, com direcionamento político -não que não seja legítimo-, mas entendemos que não contribui.”
Entre sexta-feira (24) e sábado, políticos de esquerda, como Ciro Gomes (PDT), Guilherme Boulos (PSOL), Sâmia Bomfim (PSOL) e Manuela D’Ávila (PCdoB), demonstram apoio à manifestação em seus perfis no Twitter. Antes do dia 25, um protesto havia sido marcado para 12 de julho, mesmo dia de um protesto contra o governo federal. Nas ruas, era possível identificar a presença de dois grupos.
O Treta no Trampo, que se organiza pela internet em outras pautas trabalhistas e defende a autonomia do motoboy com melhores condições, mas não a CLT, e o Entregadores Antifascistas, que tem integrantes da esquerda.
Com um ato organizado no estacionamento do estádio Pacaembu, na zona oeste da capital, alguns motoboys do Treta no Trampo chegaram a discutir os com representantes do Entregadores Antifascistas antes que se estabelecer o diálogo e a união numa foto.
Com uma faixa no chão que dizia “a guerra continua”, diante de uma pilha de bags de aplicativos, um motoboy com máscara da bandeira do Brasil entoou “Deus acima de tudo” para um grupo de manifestantes. Houve vários momentos de discussão acalorada, mas sem agressão física.
O entregador em questão trazia em sua bag um adesivo do Patriota, partido de direita. Alguns entregadores se incomodaram com o tom das palavras e também com o adesivo. Para evitar confusão, o manifestante concordou em retirar o adesivo do partido.
Paulo Lima Galo, um dos líderes do Antifascista, usava uma máscara do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, que é de esquerda). Um dos e entregadores questionou por que alguns podiam defender o MST e outros não podiam trazer adesivos de partidos. “A gente pode estar aqui também? A gente tem direito de voz?”, questionou Galo.
Após discussões, os motoristas concordaram, em parte, que o espaço era plural e que o foco deveria ser a mobilização pelo ‘breque’. Alguns gritavam “brecar, brecar até a taxa aumentar”. Basicamente, houve uma disputa de protagonismo pelo título Breque dos Apps, mas também convergência crítica sobre taxas dos aplicativos.
“A gente precisa de melhores taxas e fim dos bloqueios. As empresas dizem que não reduziram taxas, é merchandising. Trabalhamos há um mês com panfletagem, WhatsApp, movimento na internet pra mostrar isso”, diz Jefferson Cortez, que vestia camiseta branca como outros motoboys com a inscrição “Entregadores do Breque”.
Quem ajudou a organizar com camisetas e faixas foi o Treta no Trampo. Antes da reunião no Pacaembu, os motoboys fizeram piquetes em alguns shoppings, como Center 3 e o Center Norte, para tentar conscientizar, como dizem, entregadores que iam buscar pedidos.
Eles afirmaram que não vetaram qualquer entrega, mas que a ideia era parar os motoboys e conversar. Em frente ao Masp, na avenida Paulista, o Entregadores Antifascistas mantinha uma concentração com apoiadores pela manhã. Em vários vídeos, Paulo Galo dizia que se o trabalhador tem que se “entender como trabalhador e não como empreendedor”.
“Trabalhador é coletivo. Empreendedor é individual. Eu tenho MEI, mas sou trabalhador. Não dá para colocar você numa caixa e eu na outra para impedir que a gente junte”, afirmou.
Galo é o porta-voz do grupo que mais aparece. Ele ganhou notoriedade política ao formar o grupo no protesto atirracista no fim de maio. A hashtag do Breque dos Apps ficou mais de quatro horas como um dos assuntos mais comentados no Twitter. Entregadores afirmaram que aplicativos enviaram promoções por SMS.
Em nota, o iFood disse que o sábado foi “dentro do padrão desse dia da semana, inclusive no que diz respeito às promoções feitas para os entregadores”.
A assessoria de imprensa da Uber Eats disse que a empresa não fez promoções hoje. A Rappi afirmou que “é prática comum da plataforma disponibilizar promoções e cupons de descontos para usuários”.
A ANR (Associação Nacional de Restaurantes ) afirmou que é prematuro avaliar o impacto dos motoristas que decidiram não entregar e dos consumidores que apoiaram a ideia.
“É cedo porque o delivery é forte à noite. O que tivemos de relatos de Rio e São Paulo é que os pedidos estão chegando, mas houve uma diminuição do número por parte dos consumidores”, diz Fernando Blower, diretor da associação.
A maior parte dos motoboys pede taxas maiores (alegam que a situação financeira piorou na pandemia), fim dos bloqueios chamados de injustificados, seguro contra acidente e um preço mínimo único aos apps. O Sindimoto diz apoiar “qualquer manifestação contra a precarização”, mesmo que não tenha ido para a rua.
Eles tentaram fazer uma mediação com as empresas no TRT no dia 14, mas a audiência não aconteceu por problemas técnicos e uma nova data não foi remarcada. Os Entregadores Antifascistas também defendem CLT.
As principais empresas que são alvo de crítica dos entregadores são Rappi, iFood, Uber Eats e Loggi – as mais populares. De modo geral, elas dizem que oferecem preço mínimo por entrega, seguro em caso de acidente, parceria com clínicas médicas e que não excluem de forma deliberada de suas plataformas.
Elas também afirmam que não reduziram taxas pagas durante a crise de covid.
O iFood, por exemplo, diz que não aumentou o número de cadastrados no app durante a pandemia e que, portanto, não diluiu as entregas e os preços pagos. A Rappi afirma que fez alterações em seu critério de pontuação no app para atender uma demanda da categoria, passando o acúmulo de pontos de semanal para mensal.
Nesse sistema, motoristas precisam atingir um número de corridas para conseguir atender pedidos em regiões que remuneram mais. Eles dizem que isso joga a remuneração para baixo, pois estimula que fiquem disponíveis em apenas em um aplicativo (grande parte se cadastra em várias plataformas ao mesmo tempo).
A ABO2O (Associação Brasileira Online to Offline), que reúne startups de mobilidade urbana e delivery, diz que desde o início da pandemia os aplicativos de entregas implementaram formas para garantir a segurança dos profissionais, com seguro contra possíveis acidentes durante a realização de entregas e distribuição de kits de proteção (com máscaras e álcool em gel).
“As plataformas reiteram que não houve redução de valores e disponibilizam de forma transparente as taxas e valores destinados para os entregadores”, afirma a associação, acrescentando que a crise pandemia gerou o fechamento de quase 5 milhões de postos de trabalho.
Um movimento organizado de entregadores se reuniu com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) no último mês, que prometeu pautar projeto de lei. Na reunião, eles afirmaram que 59% dos motoristas tiveram queda remuneratória durante a pandemia e que chegam a 5 milhões no Brasil.
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