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Delatores da Odebrecht abrem firmas, arrumam emprego ou seguem na empresa

Vários delatores viraram consultores financeiros, de engenharia, construção ou outros negócios. Alguns foram trabalhar com a família, ou em outras grandes empresas e há até mesmo quem manteve o emprego, apesar de tudo.


Por Folhapress Publicado 03/06/2019

Marcos, Emyr, Júnior e Newton foram delatores da Odebrecht na Lava Jato. Hoje o primeiro abriu um petshop, o segundo é dono de um haras, o terceiro tem um restaurante e o último abriu uma empresa de tratamento de água.

Pouco mais de três anos após o início das tratativas daquela que ficaria conhecida como “a delação do fim do mundo” -dado o alcance e poder de destruição no mundo político das denúncias que estavam por vir-, delatores da Odebrecht seguem suas vidas profissionais sem embaraços.

Vários delatores viraram consultores financeiros, de engenharia, construção ou outros negócios. Alguns foram trabalhar com a família, ou em outras grandes empresas e há até mesmo quem manteve o emprego, apesar de tudo.

De acordo com levantamento feito pelo UOL, dos 79 então integrantes da Odebrecht que fecharam acordo de delação premiada com a PGR (Procuradoria-Geral da República) -77 na “delação do fim do mundo” e outros dois funcionários em separado- 12 deixaram a companhia e abriram novas firmas.

Outros 50 foram trabalhar em negócios próprios ou de familiares, já existentes antes da delação, ou ainda em outras empresas do mercado -duas dessas empresas possuem contratos pequenos com o governo federal em Pernambuco– e pelo menos 11 continuaram a trabalhar na Odebrecht logo após a delação.

Procurada pela reportagem, a empresa não confirma quantos delatores ainda trabalham por lá hoje em dia. Emílio Odebrecht, patriarca da família, dono da Odebrecht e também um dos delatores, continua na empresa organizando a transição pós-delação, por exemplo, mesmo sem cargo formal.

Era 22 de março de 2016 quando a Odebrecht emitiu um comunicado ao mercado informando que passaria a colaborar com a Lava Jato.

De acordo com apuração feita pelo jornal Valor Econômico na época, cada delator recebeu da Odebrecht R$ 15 milhões em média, como compensação financeira da empresa. A quantia seria distribuída porque os funcionários delatores sofreriam restrições de atuação e poderiam ter dificuldades profissionais no futuro. A Odebrecht nunca confirmou o valor da indenização paga aos delatores.

Um dos delatores conversou com o UOL mas não quis dar entrevista identificado. “Perdi o contato com esse pessoal depois daquele rolo todo, mas pelo que sei todo mundo tá entrando muita dificuldade profissional depois de tudo.” Ele conta que transformou uma paixão pessoal em negócio depois da delação, mas não ganha muito dinheiro com a atividade.
Segundo o MPF-PR (Ministério Público Federal do Paraná), que comanda as investigações da Lava Jato em Curitiba, em cada termo de colaboração há uma pena a ser cumprida pelos delatores. Porém, há vários executivos que foram denunciados, viraram réus mas ainda não foram condenados.

De acordo com o MPF-PR, por meio de sua assessoria de imprensa, como foi o STF que homologou as delações, é a corte suprema quem saberia informar qual a pena prevista para cada réu, assim como as possíveis restrições profissionais impostas a cada um atualmente. Procurado pelo UOL, por meio de sua assessoria de imprensa, o STF não informou a situação penal de cada delator e diz que ainda há diversos acordos sob sigilo de Justiça.

Nos acordos de delação, segundo o divulgado na época, a PGR fixou três tipos de regimes para cumprimento da pena dos delatores: domiciliar fechado, domiciliar semiaberto (com possibilidade de trabalho durante o dia) e domiciliar aberto (recolhimento apenas nos finais de semana). Ou seja, ninguém mais iria para a cadeia.

Questionada pelo UOL, também por meio de sua assessoria de imprensa, a PGR não respondeu se há alguma violação dos termos de delação em relação aos executivos e ex-executivos da Odebrecht e qual a situação penal de cada delator. De acordo com a procuradoria, cada caso é um caso e as sanções profissionais variam de delator para delator.

Os depoimentos dos executivos da empreiteira resultaram no maior acordo de delação do mundo, com 89 apurações abertas pela PGR. Destas, 22 foram arquivadas sem virar processos penais e 13 delas foram jogadas fora por falta de provas.

Outras 27 investigações foram para a primeira instância, a maior parte para a Justiça Eleitoral.

Até agora o MP e o Judiciário arquivaram casos relacionados, por exemplo, ao ex-ministro Blairo Maggi (PR-MS), ao senador Eduardo Braga (MDB-AM), e aos ex-senadores Marta Suplicy (MDB-SP) e Ricardo Ferraço (MDB-ES). Já o STF arquivou a maioria das investigações contra o senador José Serra (PSDB-SP), e o que sobrou foi enviado para a Justiça Eleitoral.
Marcelo Odebrecht, herdeiro e ex-presidente do grupo, afastado após o escândalo de corrupção que engolfou a empresa, está entre os únicos executivos da Odebrecht que chegou a ser preso – antes da delação, outros dois executivos tinham sido presos e foram libertados após o acordo.

Réu confesso e condenado na Lava Jato em dois processos a 31 anos de prisão, ele ficou na cadeia de junho de 2015 até dezembro de 2017, quando passou para a prisão domiciliar em sua casa, em São Paulo. O acordo de delação prevê ainda cumprimento de apenas 10 anos da pena total.

Desde março ele pode pedir progressão para o regime semiaberto –onde o réu pode passar o dia na rua trabalhando e voltar (no caso dele, para casa) apenas de noite. O acordo do ex-executivo prevê que ele não volte a ter um cargo de comando na Odebrecht, mas nada impede ele de passar a ser um funcionário da própria empresa.

Procurado pela reportagem para falar da vida pós-delação e se pretende voltar aos negócios da família, por meio da assessoria de imprensa da Odebrecht, Marcelo não respondeu aos pedidos de entrevista.

O patriarca e também um dos delatores, Emílio Odebrecht, está com 74 anos e não deve voltar aos negócios da família. Com fundos de investimento e fazendas pessoais em um valor total de pelo menos R$ 1,5 bilhão, de acordo com dados disponíveis na Receita Federal, seu acordo de delação prevê um afastamento total dos negócios do grupo e pena de prisão domiciliar de 4 anos, que ele ainda não começou a cumprir.

Seu acordo de delação prevê que ele comece a pagar a pena apenas a partir de dezembro deste ano, para antes reorganizar a empresa após as delações. Vive entre São Paulo e Salvador. Procurado pelo UOL, Emílio não quis conceder entrevista.

Pedro Novis, ex-presidente da empreiteira antes de Marcelo Odebrecht e um dos principais delatores da empresa junto com Marcelo e Emílio, ficou um tempo ajudando o filho a cuidar da fazenda da família, no interior de São Paulo, e pelo menos desde o ano passado está de volta ao mercado, com um escritório de consultoria de negócios em São Paulo. Ele não respondeu ao pedido de entrevista do UOL.

Euzenando Prazeres de Azevedo, também um dos delatores do grupo, possui uma empresa de gestão imobiliária desde antes do escândalo, a EP2 Investimentos Ltda., aberta em 2002. Em 2018 e 2019, a Receita Federal fez nove pagamentos à empresa, no valor total de R$ 178.390,99, referentes ao aluguel de salas comerciais em Jaboatão dos Guararapes (PE). O UOL não conseguiu conversar com Euzenando.

Procurada pela reportagem, 4ª Região Fiscal da Receita Federal, responsável pelas atividades em Pernambuco, informou em nota da assessoria de imprensa que aluga um espaço da empresa desde março de 2018. O órgão informa que antes da contratação e a cada pagamento, faz consultas nos bancos de dados cabíveis para confirmar as certidões negativas de débito e outras informações, e até hoje não encontrou nenhuma restrição para a contratação do aluguel.

O UOL procurou também todos os delatores citados na reportagem e confirmou a ocupação atual deles. Alguns conversaram com a reportagem informalmente, mas não concordaram em dar entrevistas.

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