Países europeus endurecem regras e exigem máscaras mais resistentes contra Covid-19
Segundo a líder técnica para Covid-19, Maria van Kerkhoven, as recomendações já publicadas pela OMS continuam válidas
O governo francês publicou na última sexta (22) um decreto proibindo o uso em público de máscaras feitas em casa, por não considerá-las eficientes contra variantes mais contagiosas do coronavírus.
A avaliação é diferente da OMS (Organização Mundial da Saúde), que, também na sexta, afirmou que máscaras caseiras continuam sendo eficientes, desde que feitas com material adequado e utilizadas da forma correta. Segundo a líder técnica para Covid-19, Maria van Kerkhoven, as recomendações já publicadas pela OMS continuam válidas: as máscaras de tecido não cirúrgicas podem ser usadas por todas as pessoas com menos de 60 anos que não tenham problemas de saúde específicos.
Van Kerkhoven ressaltou que a agência está em contato com autoridades de saúde de vários países para revisar as regras, se necessário. Por enquanto, porém, não há comprovação científica de que as máscaras caseiras não protejam contra o vírus, reforçou a Academia Francesa de Medicina, que criticou a medida do governo.
A decisão da França segue medidas semelhantes tomadas pela Áustria e pelo estado alemão da Bavária, que tornaram obrigatório o uso de máscaras com maior fator de proteção (FFP2) no transporte público e em lojas. De acordo com o decreto francês, as máscaras permitidas agora em público são de três tipos: as cirúrgicas (usadas em hospitais, geralmente com um dos lados azuis), as FFP2 (usadas para evitar a aspiração de partículas) e as chamadas máscaras de tecido industrial da “categoria 1”.
Não há uma padronização global sobre a eficácia de cada tipo de máscara.
Segundo a associação francesa de normas técnicas, as cirúrgicas filtram pelo menos 95% das partículas de 3 micrômetros e as máscaras de tecido categoria 1 filtram 90% das partículas, contra 70% para categoria 2. Já as FFP2 são as mais eficientes: bloqueiam 94% das partículas de mais de 0,6 micrômetro.
Embora o coronavírus Sars-CoV-2 tenha um diâmetro menor (de cerca de 0,12 micrômetro), ele é transmitido envolvido em saliva, em gotículas ou aerossóis que podem ter o diâmetro de 1 a 10 micrômetros, quando uma pessoa fala.
Para a União dos Sindicatos de Farmacêuticos da França, porém, as máscaras FFP2 não são indicadas para o dia a dia, porque, justamente por filtrarem mais, dificultam a respiração. A entidade afirma que elas se destinam principalmente a equipes de enfermagem e aos que ficam em contato próximo e frequente com doentes de Covid-19.
A entidade sindical adverte que tornar o uso desse produto obrigatório pela população pode levar a uma falta do equipamento em locais onde elas realmente são necessárias, como os hospitais e asilos. Essa é também uma preocupação da líder técnica da OMS.
“Ainda temos falta de equipamento de proteção no mundo, e os profissionais de saúde precisam ser a prioridade”, diz Van Kerkhove. Fabricantes do equipamento dizem que a escassez de máscaras não deve ser um problema na França, onde 25 novas fábricas passaram a operar, elevando a oferta semanal de 3,5 milhões, antes da pandemia, para mais de 100 milhões de máscaras.
Ainda assim, há o problema do preço. Na Bélgica, uma unidade de máscara cirúrgica custa menos de R$ 2, enquanto cada máscara FFP2 custa em torno de R$ 22. O preço dez vezes maior é semelhante em países como o Reino Unido, a França e a Alemanha.
Na Bavária, antes de obrigar o uso da máscara o governo comprou 2,5 milhões de unidades para distribuir aos que não podem comprá-la. Médicos se preocupam ainda com o risco de que o uso da máscara FFP2 dê uma falsa sensação de proteção, que faria as pessoas reduzirem seus cuidados contra o contágio. Além disso, de acordo com testes de laboratório, as versões que têm válvulas deveriam ser evitadas, porque não evitam que um usuário contaminado transmita o vírus para outras pessoas (veja vídeo).
Na França, que atualmente discute uma nova política ambiental, a sustentabilidade da nova regra do governo também foi posta em questão, já que, diferentemente das máscaras caseiras, as FFP2 são descartáveis.
BRASIL
De acordo com a infectologista Raquel Stucchi, pesquisadora da Unicamp e consultora da SBI (Sociedade Brasileira de Infectologia), não há nenhuma comprovação científica de que as máscaras caseiras de tecido não sejam efetivas contra as novas variantes do coronavírus. Por enquanto, há apenas uma suposição.
“O que mudou no vírus foi um pedaço dele, ele não mudou de tamanho. As maneiras de transmissão também continuam as mesmas. Dessa forma, as máscaras de modo geral continuariam bem eficientes”, afirma a cientista.
Segundo ela, como há muitas pessoas que usam a máscara de forma incorreta, não é possível dizer se as pessoas estão se infectando apesar do uso das máscaras, o que indicaria a necessidade de proteções melhores.
De acordo com a empresa de dados de mercado Statista, o número de pessoas que fazem uso constante da proteção varia bastante entre os países europeus. Enquanto na Espanha cerca de 96% declaram usar as máscaras sempre, o número cai para 66% no Reino Unido e 12% na Suécia.
Pesquisa Datafolha realizada no início de novembro verificou se os entrevistados de São Paulo, Rio e Recife usavam corretamente a máscara no momento do questionário. O maior respeito foi identificado em São Paulo, onde 81% usavam a proteção de maneira adequada e apenas 12% não estavam sem. Já a menor adesão à máscara foi registrada em Recife, onde 70% utilizavam a proteção.
Stucchi lembra que as máscaras devem ter pelo menos duas camadas de tecido de trama mais fechada para proteger contra o vírus, mas não podem dificultar a respiração. O equipamento deve cobrir boca e nariz e não deixar espaços nas laterais, ficando bem ajustado ao rosto. “Máscaras de crochê, que estão na moda, são bonitas, mas sem eficácia”, afirma.
Artigos científicos que investigam eficácia das máscaras contra o vírus apontam proteção semelhante entre máscaras de tecido e produtos industrializados. Um dos mais recentes, publicado em dezembro de 2020 na revista científica Aerosol Science and Technology por cientistas do CDC (Centros para o Controle e Prevenção de Doenças dos Estados Unidos), mostrou que máscaras feitas com três camadas de tecido têm poder para barrar 51% dos aerossóis que uma pessoa pode expelir em uma tosse. Uma máscara cirúrgica pode bloquear 59% dos aerossóis em uma mesma situação.
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