Feminismo protesta na América Latina
. O homicídio de mulheres com 15 anos ou mais, mortas por razão de gênero, vem ocorrendo de maneira assustadora na região
Em 2018, 3.529 mulheres foram vítimas de feminicídio em 15 países da América Latina e do Caribe, segundo a Comissão Econômica para América Latina e Caribe (Cepal). O homicídio de mulheres com 15 anos ou mais, mortas por razão de gênero, vem ocorrendo de maneira assustadora na região: uma vítima foi morta a cada duas horas na América Latina e Caribe apenas pelo fato de ser mulher.
A luta contra o feminicídio faz parte da pauta de grupos feministas latino-americanos que retomam sua agenda de protestos a partir de hoje, Dia Internacional da Mulher. “Todos os anos, as mulheres comemoram esse dia e, dessa vez, é um ano de movimentação social. É um momento importante para denunciar muitas coisas”, afirma Marcela Betancourt, chilena de 48 anos, do movimento Las Tesis Senior, de mulheres com mais de 40 anos que replicaram a coreografia Um Violador em seu Caminho, em um vídeo que viralizou na internet.
No Chile, o grupo Las Tesis ganhou notoriedade no ano passado, quando rompeu as fronteiras e chegou à Europa. Mas a história começou em Valparaíso como um grupo de artes cênicas. “A
transformação social não tem incluído o feminismo, o direito das mulheres. Então, as meninas de Valparaíso fizeram uma performance para passar a mensagem de como somos abusadas e tratadas como culpadas por esse abuso. E elas fizeram algo que já há muito sabemos, falaram do Estado como cúmplice porque não fornece cuidados com o bem-estar da mulher”, disse Marcela.
Muitos outros grupos feministas traduziram a letra para seus idiomas e a coreografia Um Violador em seu Caminho escapou das ruas chilenas e ganhou o mundo. No Brasil, no ano passado, a interpretação foi feita no Rio de Janeiro e em São Paulo. “Em todo mundo, as mulheres têm medo de caminhar sozinhas, de pegar um Uber à noite, de ficar por último no trabalho. Muitas sofrem abusos dentro do próprio relacionamento. Essa explosão é assim porque temos um elemento em comum: o medo de caminhar sozinhas”, resume Marcela, que convocou a realização da performance no ano passado em frente ao Estádio Nacional, em Santiago.
“O Estádio Nacional foi um centro de abuso durante a ditadura. Nossa performance foi uma homenagem a essas mulheres assassinadas lá. Fizemos o convite e cerca de 10 mil mulheres participaram”, lembra a ativista.
No Chile, uma decisão do Senado, na semana passada, foi vista como uma vitória para esses grupos: a aprovação, por 28 votos a favor, 6 contra e 4 abstenções do projeto de lei que “garante a paridade de gênero nas candidaturas que podem vir a integrar a nova Constituinte”. Agora, a lei deve ser promulgada pelo presidente, Sebastián Piñera.
A Constituinte escreverá uma nova Carta Magna para substituir a escrita ainda na ditadura de Augusto Pinochet (1973-1990), uma das demandas mais presentes nas manifestações sociais do ano passado. Um plebiscito sobre o tema será realizado no dia 26 de abril.
“Nunca tivemos uma Constituição cidadã, sempre a mesma oligarquia que decide e muitos direitos não são respeitados. Agora, é um momento histórico para mudar a Constituição com paridade de gênero. A mulher tem de ficar dentro dessa transformação. Não podemos ficar segregadas novamente”, afirma a ativista.
Vizinhança. No México, grupos feministas também convocaram marchas para hoje e uma paralisação para amanhã denominada #Undíasinnosotras (#UmDiaSemNós). Recentemente, dois feminicídios na Cidade do México – o de uma jovem de 25 anos, esfaqueada por seu parceiro, e o de uma menina de 7 anos, vítima de abuso sexual – abalaram o país e impulsionaram os movimentos.
O protesto contra a violência de gênero chegou até as igrejas. Situada em um bairro da capital, a Igreja de São Cosme e São Damião decidiu retomar a tradição católica de cobrir na Quaresma todas as imagens e esculturas religiosas com mantos roxos. Neste ano, porém, foram recobertas apenas as figuras femininas.
Enquanto grupos feministas exigem do presidente mexicano Andrés Manuel López Obrador políticas públicas para combater a violência contra as mulheres, o mesmo se repete no Peru, onde o número de feminicídios, em 2019, foi o mais alto em uma década: 168 casos. Grupos feministas peruanos também convocaram marchas para o Dia Internacional da Mulher.
Na Argentina, os protestos de movimentos feministas coincidem com a retomada da discussão sobre a despenalização do aborto. Nesta semana, o presidente argentino, Alberto Fernández, apresentará um projeto de legalização da prática ao Congresso.
Usando bandanas verdes, as ativistas em favor da legalização do aborto devem fazer uma greve de mulheres e uma marcha até o Congresso argentino amanhã. Hoje, será realizada uma missa na Basílica de Luján, a 75 quilômetros de Buenos Aires, com o lema “Sim às mulheres, sim à vida”, organizada pelos grupos contrários à legalização do aborto. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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