Greta Thunberg foi de ativista solitária a alvo de ataques em um ano
Menina tem apenas 16 anos
Um ano depois de começar uma greve solitária pelo clima às sextas-feiras em Estocolmo, sentada no chão com um cartaz, a ativista sueca Greta Thunberg, 16, mobilizou milhões de pessoas por ações contra as mudanças climáticas, discursou na abertura da cúpula do clima da ONU, em Nova York, e virou alvo de uma campanha difamatória.
Políticos de direita, céticos do clima, comunicadores e até mesmo pessoas que apoiam a causa climática nas redes sociais mas levantam suspeitas sobre sua influência e sua origem passaram a colocar a jovem sueca na mira, especialmente na última semana.
Thunberg já era uma espécie de celebridade entre milhares de jovens pelo mundo e ambientalistas, mas saiu dessa bolha e atraiu os holofotes mundiais de vez após ter feito o discurso de maior repercussão em uma cúpula climática que contou ainda com 63 discursos de chefes de Estado.
“Vocês roubaram minha infância com suas palavras vazias”, disse, visivelmente emocionada. “Como ousam?”
Muitas das críticas tinham preconceito com o fato de Thunberg ter síndrome de Asperger, condição do transtorno de espectro autista.
Um canal de TV americano se retratou após um comentarista descrevê-la como doente mental. Um radialista brasileiro foi demitido e disse ter “passado do ponto” após dizer que Thunberg era histérica e precisava de sexo. O meteorologista da USP, Ricardo Felício, que nega o aquecimento global, disse em rede social que Greta precisava de tratamento psiquiátrico.
O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) publicou na quarta-feira (25) uma montagem nas redes sociais que mostrava a sueca se alimentando em um trem enquanto crianças aparentemente pobres apareciam na janela do veículo e a acusou de ser financiada pelo magnata George Soros. O deputado admitiu depois saber que se tratava de uma montagem.
As mentiras foram longe: Thunberg foi acusada de ser ligada ao Estado Islâmico e de ser filha de terroristas e satanistas. Até seu visual, com tranças, foi comparado ao de meninas de cartazes nazistas.
Em rede social, Thunberg se defendeu dizendo que seus pais –a cantora de ópera Malena Ernman e o ator e produtor Svante Thunberg– são seus únicos financiadores e que atua com independência. “Não há ninguém ‘por trás’ de mim exceto eu mesma. (…) Às vezes apoio e coopero com ONGs que trabalham com clima e meio ambiente, mas sou absolutamente independente.”
Também mostrou orgulho ao falar sobre ter síndrome de Asperger: “Eu tenho asperger e isso significa que às vezes eu sou um pouco diferente da norma. E –dadas as circunstâncias certas– ser diferente é um superpoder”.
O neuropediatra Clay Brites, do Instituto Neurosaber, afirma que quem tem Asperger costuma ter uma superconcentação em um assunto que acha fascinante. Necessidade de repetição e constância são outras características de quem tem a síndrome. Não há deficiência cognitiva –pelo contrário, o desempenho escolar costuma ser ótimo.
“Ela é introspectiva, mas dá respostas diretas”, diz a ambientalista brasileira Paloma Costa, 27, que discursou ao lado de Greta Thunberg na abertura da cúpula de clima da ONU na segunda-feira (23). Costa conta ter questionado a jovem sueca sobre o que a motivou em seu ativismo. “Ora, o mundo está em uma crise climática”, disse.
Em agosto do ano passado, disse que não fazia mais sentido ir à escola já que não haveria futuro por causa das mudanças climáticas. Trocou o período escolar por expedientes à frente do Parlamento sueco, onde protestava com uma placa dizendo “greve escolar pelo clima”.
Antes disso, Thunberg havia vencido um concurso de redação de um jornal sueco em que argumentava sobre a crise climática. Foi procurada por líderes como Bo Thorén, do movimento Fossil Free Dalsland, para discutir ações lideradas por jovens.
A ideia da greve surgiu nas conversas, inspirada pelo movimento dos alunos da Marjory Stoneman Douglas High School, em Parkland, Flórida, que se recusaram a ir à escola após ataques a tiros deixarem 17 mortos.
Thunberg, porém, conta ter se desligado do grupo e seguido sozinha com a proposta.
Em poucos meses o movimento passou a ser repetido por outros grupos de jovens. Após o incômodo de pais e professores, uma trégua foi negociada, e a partir de 8 de setembro as greves passaram a acontecer somente às sextas-feiras. Começou ali o movimento #FridaysForFurture (sextas-feiras pelo futuro), hoje organizado em cerca de 30 países, incluindo o Brasil.
Em outubro, um relatório científico do IPCC (painel intergovernamental sobre mudanças climáticas, na sigla em inglês) confirmaria com dados a urgência da crise climática.
Segundo o painel de cientistas reunidos pela ONU, o mundo tem pouco mais de uma década para reduzir 45% das emissões de gases-estufa (em relação aos níveis de 2010) para evitar um aumento da temperatura média do planeta superior a 1,5° C.
No mês seguinte, Thunberg já era uma das convidadas para discursar na cúpula do clima da ONU, na Polônia.
De lá para cá, foi recebida e elogiada por celebridades, ambientalistas renomadas como Jane Goodall (famosa pela dedicação aos chimpanzés na Tanzânia) e líderes como o ex-presidente americano Barack Obama, que disse que ela é um exemplo.
Do presidente americano atual, Donald Trump, Thunberg recebeu um comentário irônico. Ele republicou em seu perfil no Twitter parte do discurso dela na cúpula do clima da ONU em que dizia que as pessoas estavam sofrendo e e ecossistemas estavam entrando em colapso. “Ela parece uma jovem muito feliz à espera de um futuro brilhante e maravilhoso”, disse Trump.
Em resposta, Thunberg copiou a frase na descrição do seu perfil na mesma rede social.
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