Cidades paulistas recorrem a STF e estudos para deixar quarentena
Prefeituras se dividem entre a pressão de comerciantes para retomar a atividade econômica e a preparação do setor da saúde para atender aos contaminados
Em momentos diferentes da pandemia do novo coronavírus, municípios do interior de São Paulo avaliam a possibilidade de reabrir comércios e tentar voltar à normalidade, traçando diferentes estratégias para isso.
Prefeituras do mais populoso estado do país, onde vivem quase 45 milhões de pessoas, se dividem entre a pressão de comerciantes para retomar a atividade econômica e a preparação do setor da saúde para atender aos contaminados pelo novo coronavírus.
O governador João Doria (PSDB) avalia a reabertura gradual a partir de 11 de maio, com diferentes critérios de acordo com o quadro de cada região ou município. Por enquanto, a determinação estadual é de proibição do atendimento presencial nos comércios e restaurantes, além de escolas fechadas. Manter as pessoas distantes umas das outras é tido como a medida mais eficaz para evitar a disseminação sem controle do novo vírus, que, até esta sexta (24), já havia matado 1.512 pessoas no estado.
Algumas cidades pressionam para adiantar esse momento, como São José dos Campos, no Vale do Paraíba, que pretende ir ao Supremo Tribunal Federal para poder retomar suas atividades. Outras, como Santos, esperam o resultado de estudos científicos para decidir o que fazer. Em Ribeirão Preto, a 313 km ao norte da capital, o prefeito Duarte Nogueira (PSDB) anunciará nesta segunda-feira (27) se pretende reabrir ou não o comércio da cidade.
Embora diga que a decisão será tomada de acordo com critérios técnicos e científicos, a tendência é de reabertura, e diretrizes para isso já estão sendo preparadas, como obrigatoriedade do uso de máscaras de proteção e luvas, número máximo de pessoas por metro quadrado e disponibilidade de sabão e álcool em gel em comércios.
O governo estadual, seguindo a Organização Mundial da Saúde, afirma preconizar a testagem da população, para acompanhamento da evolução da pandemia, o monitoramento contínuo da capacidade hospitalar e o planejamento para que a abertura seja gradual e controlada. Figura importante no tucanato paulista, a decisão do prefeito de Ribeirão Preto pode criar conflito com o governador correligionário, que ainda defende o isolamento.
Até esta sexta-feira, a cidade somava 241 infecções confirmadas, com seis mortes, segundo números da prefeitura. A letalidade da doença, em 2,4%, equivale a um terço da registrada pelo estado, algo que o prefeito usa como argumento para uma possível abertura. Além disso, a taxa de ocupação de leitos tem se mantido em torno dos 20%.
“Não faz muito sentido você estabelecer um permanente altar de sacrifício para as pessoas, se você tiver condições seguras e com respaldo da ciência para fazer adequações. Aí é um contrassenso não fazê-las. A decisões do norte da Itália são diferentes do sul da Itália, porque a situação é diferente”, disse ele à reportagem. Nogueira pretende manter escolas fechadas e impedir cultos e assembleias em igrejas e templos –que estão funcionando para atendimento individual.
Segundo o monitoramento estadual, a taxa de isolamento em Ribeirão tem caído, e ficou em 41% na última quinta (23). É muito abaixo do cenário considerado perfeito pelo estado, de 70%, ou mesmo do razoável, entre 50% e 60%.
No Vale do Paraíba, São José dos Campos tentou garantir a reabertura comercial por decreto, que valeria a partir da próxima segunda, a despeito da determinação estadual. A cidade tem 174 infecções confirmadas, com seis mortes, e, segundo boletim epidemiológico, somente 11% dos leitos de UTI estão ocupados nesta sexta. O isolamento na cidade ficou em 48%, média do estado.
Além da disponibilidade alta de leitos, o prefeito Felicio Ramuth (PSDB) usa como argumentos a baixa densidade populacional, a distribuição etária mais jovem e a rotina de higiene da população. A decisão desagradou o governo paulista e depois foi barrada pela Justiça. A prefeitura diz que vai ajuizar medida no Supremo Tribunal Federal.
Já Santos é uma das cidades mais afetadas pelo novo vírus, com 433 casos confirmados, 31 mortes, e cerca de 40% dos leitos hospitalares ocupados. Na avaliação do prefeito Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), o alto número se deve à grande quantidade de testes que o município fez. “Contratamos 20 mil exames particulares, nossa capacidade de testagem é ampla. Mostramos um número de mortes real, o que, por suas limitações, o Brasil não faz”, afirma.
Ali o isolamento na quinta (23) também foi de 48%. Para elaborar as diretrizes de reabertura, a prefeitura vai participar de um estudo em que testará 10 mil pessoas, definidas por amostragem. A pesquisa será feita em quatro etapas: a cada 15 dias, vai testar 2.500 pessoas dos municípios da Baixada Santista, proporcionalmente ao número de habitantes de cada cidade. Além de testes com amostras de sangue, vão avaliar o comportamento e o isolamento dos participantes.
Campinas, uma das maiores cidades do país e com uma região metropolitana com mais de 3 milhões de pessoas, soma até a tarde desta sexta 242 casos e 11 mortes por Covid-19, e tem mais da metade dos leitos de UTI ocupados. O isolamento na quinta foi de 46%.
Segundo Andrea Von Zuben, diretora do Departamento de Vigilância em Saúde da prefeitura, a ideia é elaborar um plano de abertura com diretrizes claras sobre o que pode funcionar. Ela diz que a decisão será tomada em consonância com o governo estadual. “Vamos capacitar os comerciantes, fazer um plano com um certificado para reabrir, com aula virtual e perguntas e respostas, onde o comerciante precisa ser aprovado. Terá que ter uma etiqueta respiratória, pensar em higiene adequada, uso correto de máscara, tamanho máximo de pessoas no comércio. Estamos começando a pensar nisso”, diz.
Pelo tamanho da população da região metropolitana, é preciso que essas medidas sejam tomadas em consonância com os municípios vizinhos. “Vamos supor que a gente autorize a abertura do comércio. As pessoas que trabalham e frequentam as lojas, muitas vezes, são de outras cidades da região. E uma parte importante dos pacientes internados também não reside em Campinas. A gente quer fazer um plano de ação conjunto”, afirma Von Zuben.
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